domingo, 28 de novembro de 2010

TRINDADE ONTOLÓGICA E ECONÔMICA E O CONSELHO INTRATRINITÁRIO

TABELA DEMONSTRATIVA DA "TRINDADE ONTOLÓGICA" E DA "TRINDADE ECONÔMICA"

Sobre a dinâmica existente entre a Trindade ontológica e a econômica, a tabela a seguir demonstra atributos divinos comuns entre as pessoas da Divindade, ou seja, Sua igualdade dentro da mesma essência do Ser divino e outros atributos específicos de uma ou duas pessoas da Divindade, ou seja, a operacionalidade e a subordinação funcional dentro do Ser de Deus para com as obras da Criação, inclusive a humanidade.

Cada atributo apresentado terá sua referência bíblica correspondente como respaldo textual (Obs: a tabela é uma adaptação):


(Fontes inspiradoras: Ministério de Pesquisa e Apologética Cristã - http://www.carm.org/Portugues/index.htm);
Revista “Defesa da Fé”, jan/2002, pp. 48-51 e ago/2003, p.59 ;
Livro “Seitas e Heresias - Um sinal dos tempos” de Raimundo F. de Oliveira, pp. 83-84).


UMA ANALOGIA DA ECONOMIA TRINITARIANA E O MODELO BÍBLICO DE ESTRUTURA FAMILIAR




É possível estabelecermos uma analogia (comparação) entre a Trindade Econômica, com sua subordinação funcional (e não de essência) com a estrutura familiar bíblica.

Observamos que no casamento (análogo à Trindade e segundo é o propósito de Deus) o homem e a mulher se tornam uma unidade impressionante de duas pessoas literalmente falando, mas que permanecem indivíduos distintos (1Co 6:16-20; Ef 5:31).

Em um certo grau, o relacionamento matrimonial possui uma imagem semelhante ao relacionamento entre Deus Pai e Deus Filho na Trindade Econômica (cf. 1Co 11:3), ou seja, da mesma forma que o Pai tem autoridade sobre o Filho na economia trinitariana, por ter precedência na eternidade (Trindade ontológica), também o marido possui autoridade sobre a mulher na vida conjugal por ter sido criado primeiro (1Co 11:3, 8-9). Este fato não significa, no entanto, que haja um desmerecimento da parte subordinada. Da mesma forma como o Pai e o Filho são iguais em importância e divindade, também o marido e a mulher são iguais em importância e humanidade.

E, apesar de não estar exposto claramente nas Escrituras Sagradas, a realidade dos filhos, dentro do contexto do casamento, no fato de serem procedentes do pai e da mãe e estarem debaixo da autoridade de ambos é de certa forma semelhante à relação do Espírito Santo com o Pai e com o Filho (procedente e debaixo da autoridade de ambos).

O "CONSELHO INTRATRINITÁRIO"

O Conselho intratrinitário (ou Conselho Eterno) diz respeito às obras que ocorrem e os decretos que são estabelecidos dentro do Ser infinito, eterno e indivisível de Deus (ontológica: relacionamento intratrinitário), que por sua vez, refletem diretamente nos acontecimentos temporais, ou seja, na maneira como o próprio Deus atuou e atua na história humana e da criação (econômica: relacionamento intertrinitário).

No seu livro “As duas naturezas do Redentor”, Héber Carlos de Campos, sabiamente trouxe considerações que nos auxiliam grandemente neste estudo:

“O Conselho Eterno, que é estabelecido entre as Três Pessoas da Trindade, refere-se aos planos do Deus Triúno com respeito à criação, queda e redenção de pecadores, inclusive a Pessoa e a obra do Redentor. Esse plano feito na eternidade tem a ver com o decreto de Deus que abrange todas as coisas que acontecem na história do mundo (...)” (p. 28).
Mais adiante, Héber Campos complementou:

“(...) Diz respeito às Três Pessoas eternas, as únicas existentes desde sempre, que tomaram as decisões com relação a todas as coisas que viriam a acontecer no mundo e na história dos homens, que são chamadas ‘decretos de Deus’ (...)” (p. 29).

Convém mencionar que esta doutrina do Conselho Intratrinitário não é exaustivamente apresentada nas Escrituras, mas deduzida logicamente de inúmeros textos e, por não haver uma afirmação ou nomenclatura explícita no texto sagrado, há muita divergência de termos e considerações entre os teólogos.

Sem o desejo de nos aprofundar neste tema, por carecer de embasamento bíblico mais consistente para tal, poderíamos afirmar por esclarecimento proveniente de outros textos bíblicos que:

1º) Deus Pai é o líder do Conselho Eterno pela Sua própria denominação de “Pai”, tendo assim, na eternidade, precedência na essência trinitária diante do Filho e do Espírito, os quais possuem uma subordinação funcional para com Ele. Pode ser que foi o Pai quem tomou a iniciativa do “façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança” (Gn 1:26) quando a Trindade criou os seres humanos. Pode ter sido iniciativa do Pai para que a Trindade descesse à Terra para confundir a linguagem do povo de Babel (Gn 11:5-8). Seguramente foi iniciativa do Pai reconciliar-se com os pecadores enviando o Seu Filho (Jo 3:16).

2º) Deus Filho é o executor das decisões do Conselho Eterno. Apesar de não haver diferenças na essência divina, o Filho é tanto executor da criação (Jo 1:3; Cl 1:16) quanto da redenção (Jo 3:16; Ef 1:4-5,11; 3:8-11; comparem com Is 9:6 e Cl 2:3).

3º) Deus Espírito é o comunicador do Conselho Eterno. Ele conhece plenamente e nos revela os mistérios e os conselhos ocultos e as profundezas do Ser de Deus (1Co 2:10-13). Inclusive, dentro da execução das decisões deste Conselho para a redenção da humanidade, o Espírito preparou uma natureza humana para o Redentor (Mt 1:20) e O ungiu com sabedoria e entendimento (Lc 4:18-21; cf. Is 11:2).

Os propósitos divinos são chamados na Bíblia de “conselhos” por estarem alicerçados na sabedoria divina:

“Ó Senhor, tu és o meu Deus; exaltar-te-ei a ti, e louvarei o teu nome, porque tens feito maravilhas, e tens executado os teus conselhos antigos, fiéis e verdadeiros.” (Is 25:1); “Quem guiou o Espírito do SENHOR? ou, como seu conselheiro, o ensinou?” (Is 40:13, cf. v. 14); “Quem, pois, conheceu a mente do Senhor? Ou quem foi o seu conselheiro?” (Rm 11:34).

O Conselho Eterno também fixou as leis para a criação (Jr 31:35-36), sobre a raça humana (At 17:26; cf. Gn 11:7; comparem com Gn 3:22), sobre o envio de um profeta aos pecadores (Is 6:8) e sobre o conteúdo da pregação para a redenção da humanidade (1Co 2:6-7), simplesmente chamado de “desígnios de Deus” (At 20:27).


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Nota: todos os conceitos apresentados acima foram baseados nas declarações de Héber Campos no livro “As duas naturezas do Redentor”, pp. 29 a 47).

sábado, 27 de novembro de 2010

"TRINDADE ONTOLÓGICA" E "TRINDADE ECONÔMICA"

INTRODUÇÃO

A razão da unidade da Divindade é a completa ausência de diferenças entre as pessoas no tocante a atributos divinos como poder, glória, majestade, soberania, eternidade, onipotência, onisciência e onipresença. Sendo assim, existem atributos comuns às três pessoas da Trindade, ao passo que outros são exclusivos de uma ou duas pessoas.

Os membros da Divindade possuem a mesma honra, majestade e glória, ou seja, todos constituem a natureza de Deus, mas é de vital importância também apresentarmos alguns conceitos concernentes não somente ao relacionamento intratinitário, que ocorre no Ser de Deus entre as três subsistências pessoais: Pai, Filho e Espírito Santo, mas também intertrinitário, o relacionamento entre Deus e a Sua criação.

A Confissão de Fé de Westminster expressa de forma resumida esta questão. No seu Capítulo II, que trata “De Deus e da Santíssima Trindade”, no artigo 3º, ela afirma:

“III) Na unidade da Divindade há três pessoas de uma mesma substância, poder e eternidade - Deus o Pai, Deus o Filho e Deus o Espírito Santo. O Pai não é de ninguém – não é gerado, nem procedente; o Filho é eternamente gerado do Pai; o Espírito Santo é eternamente procedente do Pai e do Filho.” (p. 32).

Mas, este artigo da Confissão expressa apenas a igualdade de ser em Deus (ontológica) e precisamos analisar também a distinção de papéis com a criação e a subordinação de relacionamento em Deus (econômica). Há, portanto, uma igualdade ontológica e uma subordinação econômica. Se não houvesse igualdade ontológica (de ser) nem todas as pessoas seriam plenamente Deus.

Trindade Ontológica

Ela tem a ver com o que Deus é, com sua essência ou natureza, onde estudamos a questão das três pessoas da Divindade e o relacionamento existente entre elas. São obras que acontecem dentro do Ser divino, na eternidade, à parte de qualquer contato com algo externo, são apresentadas em unidade, são eternas e imutáveis, pessoais e essenciais.

Estas obras não são resultantes da vontade de Deus, pois Ele não decretou ser o que é, nem houve um momento no tempo em que Ele não tenha sido o que sempre foi e será (diferentemente de Suas obras, que ocorrem no tempo). Em outras palavras, a paternidade de Deus, a geração do Filho pelo Pai e a processão do Espírito do Pai e do Filho não são obras acidentais, mas essenciais.

Vamos observar cada um destes pontos fundamentais:

1º) Paternidade: Ser Pai é exclusivo da Primeira Pessoa da Trindade. Quando alguém se torna pai, sua natureza não muda, da mesma forma com Deus, mas, há uma diferença. Deus Pai é Pai eternamente, jamais houve um tempo que Ele não o fosse.

2º) Filiação: É um atributo pessoal exclusivo ao Filho, da Segunda Pessoa da Trindade, não ao Ser divino completo. Ele é eternamente Filho do Deus Pai e não do Deus Espírito e nunca houve época em que não o fosse. Ele é eternamente gerado do Pai.

Há várias testemunhas do fato da paternidade e filiação: O Pai (Mt 3:17; 17:5; Hb 1:8); o Filho (Mc 14:61-62; Jo 19:7), os anjos (Lc 1:31,35), os demônios (Mt 8:28-29; Mc 3:11; Lc 4:41), os discípulos (Mt 16:15-16; Jo 1:34,39; 11:27; At 8:37), os apóstolos em suas pregações (At 9:20; 2Co 1:19) e até os homens ímpios (Mt 27:54).

3º) Processão: O atributo de proceder do Pai e do Filho é propriedade pessoal do Espírito Santo, não da totalidade do Ser divino. O Espírito procede ou é espirado tanto do Pai (Jo 15:26), como do Filho (Jo 16:7). Da mesma forma como vimos a respeito do Pai e do Filho, nunca houve um tempo que o Espírito não procedesse de ambos.

O Espírito Santo é “um” com Cristo e com Deus Pai. Ele é também chamado de Espírito de Jesus (At 16:7), Espírito de Cristo (Rm 8:9; 1Pe 1:11), Espírito de Jesus Cristo (Fp 1:19), Espírito do Senhor (At 5:9; 8:39; comparem com 2Co 3:14-18), Espírito do Filho de Deus (Gl 4:4-6), Espírito de Deus (Rm 8:9,14; 1Co 2:6-16; 3:16; 2Co 3:3; 1Ts 4:8) e Espírito do nosso Pai (Mt 10:19-20; comparem com Lc 11:13; 1Co 6:19; 1Ts 4:8).

Mais uma vez temos as palavras do Pr. W. E. Best, em seu artigo “A Divina Trindade”, a respeito desta questão:

“Se não houvesse nenhuma trindade na natureza Divina, a Paternidade em Deus teria um princípio e teria um fim. Além do mais, a Filiação não seria uma perfeição, mas imperfeição, pois existiria somente para um propósito temporário. O mesmo que é dito do Filho pode ser dito do Espírito Santo. Visto que a paternidade e a filiação são eternas em Deus, a lei de amor requer que os cristãos se conformem a Deus em ambos aspectos, como a mais alta dignidade do ser deles. A reciprocidade de afeição data além do tempo. Um pai humano pode ser tanto pai como filho. Contudo, isso não pode ser verdade da Pessoa Divina. Uma pessoa humana pode ser um filho e não um pai, mas tornar-se um pai subseqüentemente. Tal mudança na Deidade destruiria a imutabilidade. As três Pessoas na Deidade são co-eternas. Elas existem lado a lado, mas não independentemente ou separadamente.” (http://www.monergismo.com/textos/trindade/trindade_divina_best.htm).

Os termos “geração” e “processão”, convém afirmar, da mesma maneira que ocorre com o termo “pessoa”, como afirmamos anteriormente:

“(...) são apenas expressões aproximadas da verdade e, através de outras declarações bíblicas, devemos corrigir quaisquer impressões imperfeitas que podemos derivar somente delas. Empregamos estes termos em um sentido especial, que explicitamente estabelecemos e definimos excluindo toda a noção de desigualdade entre as pessoas da Trindade.” (A. H. Strong, “Teologia Sistemática – Vol. I”, p. 506).

Esta ordem eterna existente no Ser essencial de Deus é a base da qual se oriunda as funções específicas nas pessoas da Divindade, originando a Trindade econômica.

Trindade Econômica

Diz respeito ao modo como as coisas são feitas pelas pessoas da Trindade, embora a Divindade triúna trabalhe co-exista em unidade, as três pessoas possuem uma maneira própria e exclusiva de agir com o mundo criado (criação, providência ou redenção).

A expressão “economia” se baseia no significado já obsoleto de “ordenamento de atividades”, como antigamente costumava-se mencionar, por exemplo, a economia doméstica para as atividades não somente financeiras, mas de todas as atividades da casa.

Sobre as funções de cada pessoa da Trindade, Calvino afirmou que:

“Concluímos, portanto, que quando a palavra ‘Deus’ é usada de modo simples e indefinida, ela pertence ao Filho e ao Espírito tão verdadeiramente quanto pertence ao Pai; mas quando, por exemplo, o Pai é comparado com o Filho (em expressões tais como ‘O Pai ama o Filho’, ou ‘o Pai enviou Seu Filho’) cada pessoa divina é distinguida uma da outra por aquilo que peculiarmente lhe pertence (...)” (“As institutas da Religião Cristã – Um Resumo”, p. 62).

Bavinck também considerou sobre este assunto:

“(...) A unidade e a diversidade das obras de Deus se originam da unidade e diversidade que existem no Ser divino. Esse Ser é um Ser, singular e simples. Ao mesmo tempo Ele é tripartido em Sua pessoa, em Sua revelação e em Sua influência. Toda a obra de Deus é compacta e indivisível, mas ao mesmo tempo compreende a mais rica variedade (...)” (“Teologia Sistemática”, p. 157).

Embora haja a co-igualdade das três pessoas da Divindade, ou seja, não exista uma subordinação na essência divina, existe uma subordinação de função, que é própria da Trindade econômica.

O Deus triúno trabalha de forma que cada uma das pessoas opere diferenciadamente e nelas o Filho e o Espírito estão em uma função de subordinação, com a finalidade supra de que os eternos decretos de Deus Pai sejam cabalmente cumpridos.

A subordinação do Filho ao Pai é caracterizada pelo fato do primeiro ter sido enviado pelo segundo, e não o contrário, como uma questão de precedência na eternidade, na forma de autoridade funcional (Jo 7:29; 14:16). É caracterizada também pelo fato do Filho obedecer a vontade do Pai (Jo 4:34; 14:31) e não poderia ser ao contrário, se não o Pai deixaria de sê-lo e o Filho também. O Filho recebe autoridade do Pai (Jo 17:2) que será devolvida quanto todas as coisas da redenção forem completadas (1Co 15:28).

A subordinação do Espírito ao Filho e ao Pai revela-se pelo fato do Espírito ter sido enviado pelo Filho (Jo 16:7) e pelo Pai (Jo 14:26) e só revelar o que o Filho lhe ordenou (Jo 16:13-14).

O Filho e o Espírito não são inferiores ao Pai ou de importância menor nas relações interpessoais.

Louis Berckof, sobre esta questão afirmou, entre outras coisas, que:

“A única subordinação de que podemos falar é uma subordinação quanto à ordem e ao relacionamento.” (“Teologia sistemática”, p. 84).

Complementando este assunto, temos as palavras de Wayne Grudem:

"(...) Não podemos dizer, por exemplo, que o Pai é mais poderoso ou mais sábio que o Filho ou que o Pai e o Filho são mais sábios que o Espírito ou um existia antes do outro (...)” [p. 183] “(...) Embora, as pessoas da Trindade sejam iguais em todos os seus atributos, assim mesmo diferem nas suas relações com a criação. O Filho e o Espírito Santo são iguais em divindade a Deus Pai, mas são a Ele subordinados nos seus papéis (...)” [p. 184] “(...) As únicas distinções entre os membros da Trindade estão nas formas como se relacionam uns com os outros e com o restante da criação (...)” [p. 185] (“Teologia Sistemática”).

Não poderíamos deixar de mencionar as seguintes considerações de Strong:

“(...) A subordinação da pessoa do Filho à do Pai, ou, em outras palavras, uma ordem de pessoalidade, ofício e operação que permite ao Pai ser oficialmente o primeiro, o Filho o segundo e o Espírito o terceiro é perfeitamente consistente com a igualdade. Prioridade não é necessariamente superioridade (...)” (Strong, “Teologia Sistemática - Vol I”, p. 507).

Todo trinitarista acredita, baseado nas Escrituras que, enquanto viveu entre os homens, Cristo estava em uma posição de submissão ao Pai, que, por sua vez, era exaltado no Céu, enquanto o Filho era humilde, tendo abdicado temporariamente de Sua glória, mas não de Sua divindade. Inclusive é mencionado que o Pai era maior do que Cristo (Jo 14:28). Ora, era necessário que Jesus Cristo honrasse ao Pai enquanto possuidor de uma natureza humana que fora criada, que se unira à Sua eterna natureza divina (sobre este assunto trataremos mais detalhadamente mais adiante).

Contudo, esta questão se torna mais complexa pelo fato de que esta submissão de Cristo ao Pai ultrapassa a Sua vida histórica na Terra. Cristo fora enviado ao mundo pelo Pai (1Jo 4:9), o que deixa transparecer que em algum sentido Cristo estava em submissão ao Pai antes da encarnação. Porém, Cristo, ao encarnar, tornou-se um servo de Deus (Fp 2:8), dando a entender que Ele não estava naquele relacionamento (entre servo e senhor) com o Pai antes de tornar-se homem. Em contrapartida, após a ressurreição e a ascensão, Cristo prosseguiu referindo-se ao Pai como Seu Deus (Jo 20:17; Ap 3:12) e considerando Deus Pai como Seu ‘cabeça’ (cf. 1Co 11:3).

Podemos resolver esta aparente contradição com as seguintes posições trinitarianas:

Primeira: Tanto na Trindade ontológica como na econômica, o Filho sempre foi distinto do Pai e sempre o será, apesar de ambos possuírem a mesma essência. Aliás, deve-se dar a mesma honra tanto ao Pai como ao Filho (Jo 5:20-23);

Segunda: Na Sua natureza humana adquirida e unida à Sua natureza divina, Jesus Cristo sempre honrou ao Pai como Seu Deus;

Terceira: Mesmo antes da encarnação, Cristo se ofereceu (vicária e espontaneamente) a representar o Pai diante da humanidade e sempre buscou honrar ao Pai;

Quarta: Na Sua natureza divina (eterna e infinita como a do Pai e a do Espírito), Cristo sempre foi plenamente Deus e sempre será, como o Pai e o Espírito também o serão; e

Quinta: Como afirmamos anteriormente, devido à Sua humanidade adquirida, Cristo possui um relacionamento com Deus Pai diferente daquele que possuía antes da encarnação. Portanto, na Sua natureza divina, Ele é essencialmente idêntico ao Pai, embora no relacionamento, subordinado ou submisso ao Pai, depois de tornar-se também ser humano.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

A TRI-PERSONALIDADE DIVINA (PARTE 02)

O TERMO “PESSOA”

A declaração de que o Deus único revela-se em “três pessoas” tem sido mal interpretada tanto pelo cristianismo quanto pelos não-crentes, pois a expressão “pessoa” no que se refere à Trindade tem sido confundida como uma referência a um ser individual separado, o que daria a entender que três pessoas divinas fossem três divindades.

No entanto, este outro significado da palavra “pessoa” denota, não a existência separada, mas o relacionamento. Ao denominarmos as formas de subsistência da essência da Divindade de “pessoas”, devemos lembrar que este termo é de origem humana, ou seja, sujeito à falhas.

Bavinck afirmou:

“A palavra foi escolhida, não porque fosse mais precisa, mas porque nenhuma outra melhor foi encontrada. Neste caso a palavra está atrás da idéia, e a idéia está atrás da realidade. Apesar de não poder preservar a realidade a não ser dessa forma, nós nunca devemos nos esquecer de que é a realidade que conta, e não a palavra. Certamente, na glória, outras e melhores palavras e expressões serão colocadas em nossos lábios” (“Teologia Sistemática”, p. 171).

A Bíblia não possui o termo “pessoas”, mas emprega os termos “Pai”, “Filho” e “Espírito Santo”. E é essa verdadeira realidade da Trindade que mais importa, e não uma mera expressão humana que na verdade não satisfaz plenamente à realidade trinitariana.

W. E. Best, em seu artigo “A Divina Trindade”, trouxe importantes declarações a este respeito:

“A palavra ‘pessoa’ na teologia é definida como um modo de subsistência, a qual é marcada por inteligência, vontade e existência individual. A mente humana não pode compreender o mistério da Trindade, pois o finito não pode compreender o Infinito. A palavra ‘Pessoa’, estudada teologicamente, é usada num sentido diferente dos seus outros usos. Por exemplo, a essência Divina não pode ser ao mesmo tempo três Pessoas e uma Pessoa se ‘pessoa’ é empregada num único sentido. Contudo, ela pode ser ao mesmo tempo três Pessoas e um ser pessoal. As características pessoais pelas quais as Pessoas na Deidade se diferem uma das outras não podem ser as características pessoais da Deidade inteira. ‘Pessoa’ é usada para expressar uma idéia de personalidade dentro da Deidade. Isso evita, por um lado, a idéia de uma mera forma de manifestação e, por outro lado, a idéia de personalidades completamente independentes nos seres humanos. A verdade da Trindade não assevera que há três Deuses em um Deus (triteísmo). Ela não afirma que Deus meramente se manifesta de três formas diferentes (trindade de manifestações). Os Trinitarianos sustentam que há três Pessoas eternas na substância da Deidade (monoteísmo). O Pai, Filho e o Espírito Santo são um Deus. Cada Pessoa tem uma qualidade distintiva. Nenhuma das Pessoas é Deus sem as outras. Cada uma, com as outras, é Deus.” (fonte: http://www.monergismo.com/textos/trindade/trindade_divina_best.htm).

O termo "pessoa" é um pobre recurso humano na tentativa de expressar coisas divinas, apenas um recurso didático que revela a dificuldade existente em utilizar o nosso limitado vocabulário para referir-se a Deus.

A maioria dos teólogos, no entanto, prefere o termo hipóstase em lugar da palavra “pessoa”. Hipóstase é utilizada como um meio-termo entre a simples personalidade e um ser individual. É possível explicar este difícil conceito da seguinte maneira:

“A doutrina de uma subsistência na substância da Deidade nos dá a visão de espécies de existência que são anômalas e sem igual, e a mente humana deriva pouco ou nenhum conceito dessas analogias, as quais estão presentes em todos os casos na Trindade. A hipóstase é uma subsistência real, - uma forma sólida essencial de existência, e não uma mera emanação, ou energia, ou manifestação, - mas é um intermediário entre substância e atributos. Não é idêntica a uma substância, por isso não são três substâncias [ou seres]. Não é idêntica a atributos, por isso, são três 'pessoas' e cada uma igualmente possui todos os atributos divinos… Conseqüentemente a mente humana é induzida a aceitar a noção de espécies de existência que são totalmente incompreensíveis, e não é capaz de ilustrá-las por quaisquer das comparações comuns e analógicas.” (Dr. Shedd, História de Doutrina Cristã, vol. I. pág. 365 como citado na História da Igreja Cristã, de Philip Schaff, Volume 3, Seção 130, páginas 676, 677).

A. H. Strong considerou que:

“(...) O temo ‘pessoa’ só representa aproximadamente a verdade. Apesar de que esta palavra mais aproximadamente do que qualquer outra, expressa a concepção que as Escrituras nos dão da relação entre Pai, Filho e Espírito Santo não é de si mesma empregada nesta conexão na Escritura e empregamo-la em um sentido qualificado, não no sentido comum em que aplicamos a palavra ‘pessoa’ a Pedro, Paulo e João (...)” (Augustus Hopkins Strong – “Teologia Sistemática – Vol. I”, p. 491).

O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DO SER DE DEUS

Partindo, então, do princípio de que o termo “pessoa”, ao referir-se a Trindade, denota relacionamento e não um ser individual separado, realizaremos, a seguir, um exercício prático utilizando as nossas próprias personalidades para compreender melhor o relacionamento existente no Ser de Deus.

Olhe para dentro de si, para o mais íntimo do seu ser. Este ser é um tipo de existência eternamente limitada (dependente de Seu Criador) e temporariamente falha (não por culpa de Deus, mas do pecado humano), ela necessita crescer e aprender constantemente para se desenvolver. Esta é a escalabilidade da vida humana, que jamais atinge nem sombra da grandeza infinita e insondável de Seu Criador.

O ser humano no sentido essencial e no sentido pessoal é uma unidade simples, mas é de se esperar naturalmente que o Criador possua uma espécie de existência diferente, aliás, superior, uma vez que está infinitamente acima de Sua criação, ilimitado e absoluto. Ele, em Seu Ser, portanto, no sentido essencial é uma unidade, mas no sentido pessoal é composto de três modos de existência:

“(...) o fato de que a escala ascendente da vida é marcada pela crescente diferenciação de faculdade e função deve levar-nos principalmente a esperar no mais elevado de todos os seres uma natureza mais complexa do que a nossa. No homem muitas faculdades se unem em um ser inteligente e, quanto mais inteligente for o homem mais distintas se tornarão tais faculdades umas das outras; até que o intelecto e o sentimento, consciência e vontade admitam uma independência relativa e apareça até mesmo a possibilidade de conflito entre elas. Nada há de irracional ou autocontraditório na doutrina de que em Deus as principais funções são ainda mais notadamente diferenciadas, de modo a torná-las pessoais, enquanto ao mesmo tempo tais pessoalidades se unem pela fé em que cada uma delas e de igual modo manifestam a indivisível essência (...)” (A. H. Strong, “Teologia Sistemática – Vol. I”, p. 512).

Imagine, então, que em seu desenvolvimento da personalidade, fosse possível para a natureza humana atingir um patamar mais elevado a ponto de surgir um desdobramento, originando duas existências distintas entre as emoções e os pensamentos. Em outras palavras o seu “Eu” interior agora passaria a se relacionar com um “Tu”, um habitando no outro, no mesmo ser, mas distintos, uma bipersonalidade. Este relacionamento seria semelhante àquele existente entre as pessoas do Pai e do Filho.

Agora, imagine que neste fictício desenvolvimento de personalidade, a natureza humana pudesse alcançar mais um nível, um segundo desdobramento, resultante do primeiro. Agora, portanto, há um relacionamento interpessoal entre “Eu”, “Tu” e “Ele”, três existências distintas entre as emoções, os pensamentos e a vontade (por exemplo), uma tripersonalidade, um habitando no outro, no mesmo ser, mas distintos, a ponto de podermos aplicar os demais pronomes pessoais a esta realidade: “Nós”, “Vós”, “Eles” (dependendo do contexto). Este relacionamento seria semelhante àquele existente entre as pessoas do Pai, do Filho e do Espírito Santo (se já é difícil imaginar o primeiro desdobramento, pior ainda este segundo).

Vejamos outras considerações sobre este relacionamento existente no Ser de Deus:

"(...) Precisamos dizer que as pessoas são reais, que não são apenas modos diferentes de enxergar o ser único de Deus (...) Antes, precisamos conceber a Trindade de forma tal que a realidade das três pessoas se conserve: cada pessoa se relaciona com as outras como um ‘eu’ (primeira pessoa, um ‘você’ (segunda pessoa) e um ‘ele’ (terceira pessoa). Aparentemente, a única maneira de fazê-lo é dizer que a distinção entre as pessoas não é uma diferença no ‘ser’, mas sim uma diferença de ‘relações’. Trata-se de algo bem distante da nossa experiência humana, na qual cada ‘pessoa’ distinta é também um ser distinto. De algum modo o ser divino é tão maior que o nosso que dentro do seu ser único e indiviso pode haver um desdobramento em relações interpessoais, de forma tal que existam três pessoas distintas (...) Essa forma tripessoal de ser ultrapassa sobremaneira a nossa capacidade de compreensão. É uma espécie de existência bem diferente de qualquer coisa que já tenhamos vivenciado, bem diferente de qualquer outra coisa do universo (...)” [pp. 188-189] (“Teologia Sistemática” de Wayne Grudem).

"(...) As três ‘substâncias’ pessoais, como são chamadas, são centros coiguais e coeternos de autoconsciência, sendo cada um um ‘Eu’ em relação aos outros dois, que são ‘Vós’, cada um possuindo a plena essência divina de Deus, a existência específica que pertence só a Deus (...)” (Fonte: Bíblia de Estudos de Genebra - Nota Teológica, pg. 837 - http://www.monergismo.com/).

Obviamente na condição de seres criados, finitos e limitados, esta faculdade pessoal de tripersonalidade não nos foi outorgada, pois ela pertence única e exclusivamente a Deus, o Criador Soberano e eternamente trinitário. Em nenhum momento do tempo foram geradas as pessoas da Trindade (a geração e a procedência existente na Trindade – as quais estudaremos em seguida, pertencem à realidade incompreensível da eternidade). E esta verdade sobre a essência de Deus, além de eterna, é imutável.

domingo, 21 de novembro de 2010

A TRI-PERSONALIDADE DIVINA (PARTE 01)

A ESSÊNCIA DIVINA UNIFORMEMENTE COMPARTILHADA

Podemos observar até o presente momento que a grande dificuldade em compreensão da Santíssima Trindade reside justamente no mistério de como podem subsistir três pessoas compartilhando igualmente a Divindade.

O batismo cristão ordenado por Cristo na grande comissão missionária (Mt 28:19) deve ser efetuado “em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo”. Observe que o texto diz “nome” e não “nomes”. A ideia é que o nome de Deus é "Pai-Filho-Espírito Santo".

E como é a dinâmica interativa entre as subsistências divinas, então? Vamos expôr alguns conceitos bíblicos que podem trazer um pouco de luz a este assunto complexo.

O Reino Eterno é descrito como sendo de ambos, Deus Pai e Deus Filho onde também observamos a atuação clara da Trindade:

“Porque o reino de Deus não é comida nem bebida, mas justiça, e paz, e alegria no Espírito Santo. Aquele que deste modo serve a Cristo é agradável a Deus e aprovado pelos homens” (Rm 14:17-18)”; “Sabei, pois, isto: nenhum incontinente, ou impuro, ou avarento, que é idólatra, tem herança no reino de Cristo e de Deus.” (Ef 5:5).

Para alguns, a figura abaixo seria uma analogia artística útil para explicar o Reino Eterno de Deus sendo regido pelo Pai e pelo Filho, com a presença da alegria do Espírito Santo:


Deus Pai e Deus Filho podem atuar juntamente na direção dos crentes:

“Ora, o nosso mesmo Deus e Pai, com Jesus, nosso Senhor, dirijam-nos o caminho até vós.” (1Ts 3:11; cf. contexto: vv. 9-13).

Deus Pai e Deus Filho atuam conjuntamente no consolo e na confirmação do ministério cristão:

“Ora, o nosso Senhor Jesus Cristo mesmo, e Deus nosso Pai que nos amou e nos deu eterna consolação e boa esperança, pela graça, console os vossos corações e os confirme em toda boa obra e boa palavra.” (2Ts 2:16-17; comparem com 1:12).

Contudo, o Deus Filho é “um” com o Deus Pai, não somente no sentido de que possuem os mesmos propósitos, mas também a mesma natureza divina:

“E rogo não somente por estes, mas também por aqueles que pela sua palavra hão de crer em mim; para que todos sejam um; assim como tu, ó Pai, és em mim, e eu em ti, que também eles sejam um em nós; para que o mundo creia que tu me enviaste. E eu lhes dei a glória que a mim me deste, para que sejam um, como nós somos um; eu neles, e tu em mim, para que eles sejam perfeitos em unidade, a fim de que o mundo conheça que tu me enviaste, e que os amaste a eles, assim como me amaste a mim.” (Jo 17:21-22).

Muitas pessoas alegam que o texto acima indica que Cristo e Deus Pai possuem apenas uma unidade de propósitos e não de natureza, mas observemos outra passagem:

“Eu e o Pai somos um. Novamente pegaram os judeus em pedras para lhe atirar. Disse-lhes Jesus: Tenho-vos mostrado muitas obras boas da parte do Pai; por qual delas me apedrejais? Responderam-lhe os judeus: Não é por obra boa que te apedrejamos, e, sim, por causa da blasfêmia, pois sendo tu homem, te fazes Deus a ti mesmo.” (Jo 10:30-33; comparem com 5:17-18).

Se Jesus apenas tivesse dito que era um em propósito com Deus, ou que estava apenas realizando a obra do Pai, quando afirmou “Eu e o Pai somos um”, os brios dos judeus não teriam sido atingidos. Além do mais, eles também criam estar fazendo a vontade do Pai. Mas Ele estava declarando ser o SENHOR Deus, o Criador do universo, e havia ampla razão, segundo eles, para todas as pedras que pudessem apanhar e jogar contra Jesus. E mais: a forma neutra do numeral “um” no original grego exclui o sentido de que sejam uma única pessoa (é evidente, pois Pai e Filho são distintos entre si – Pai, Filho e Espírito Santo compartilham a mesma essência e não a mesma existência pessoal). Observemos mais alguns textos como fundamentação:

“Se eu testifico a respeito de mim mesmo, o meu testemunho não é verdadeiro. Outro é o que testifica a meu respeito, e sei que é verdadeiro o testemunho que ele dá de mim” (Jo 5:31-32; cf. 3:35; 10:17; 14:31) [grifo meu].

No texto original grego o apóstolo João inspirado pelo Espírito Santo, utilizou a expressão “allos” para indicar “outro” (“outro é o que testifica a meu respeito”), o que quer dizer “outro da mesma natureza”. Se Cristo e Deus Pai fossem apenas distintos entre si, como realmente o são, mas também fossem de naturezas diferentes, ou seja, uma divina e uma apenas humana, a palavra utilizada deveria ser “héteros” (“outro de outra natureza”). Mas, o texto indica que Cristo e Deus Pai possuem a mesma natureza, isto é, a divina. A mesma situação ocorre em relação ao Senhor Jesus Cristo e o Espírito Santo que são um em essência, mesmo possuindo personalidades distintas:

“E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, a fim de que esteja para sempre convosco.” (Jo 14:16; cf. 14:26; 16:8-11) [grifo meu].

Mais uma vez no texto original o apóstolo João utilizou a expressão “allos” que significa “outro da mesma natureza” (“outro Consolador”), o que quer dizer que se Cristo e o Espírito Santo fossem apenas distintos entre si, como realmente o são, mas também fossem de naturezas diferentes, ou seja, uma divina e uma apenas humana, a palavra utilizada deveria ser “héteros”. Mas, o texto indica que Cristo e o Espírito Santo possuem a mesma natureza, isto é, a divina.

Outra questão importante a ser salientada é que, ao contrário do que muitos podem imaginar, cada pessoa da Trindade é completa, plenamente Deus, ou seja, cada pessoa tem em si a absoluta plenitude do Ser divino.

Deus não é subdividido em três partes ou três terços. O Filho não é parcialmente Deus ou só uma parte de Deus, mas completa e plenamente Deus. O mesmo valendo para o Pai e o Espírito Santo. O Pai não é parte de Deus, mas, completamente Deus e o Espírito Santo não é uma parte de Deus, mas, totalmente Deus. Não há em Deus três vontades ou propósitos diferentes.

Wayne Grudem afirmou:

“Quando falamos conjuntamente do Pai, do Filho e do Espírito Santo, não estamos falando de um ser maior do que quando falamos somente do Pai, ou somente do Filho, ou somente do Espírito Santo. O Pai é todo o ser divino. O Filho é todo o ser divino. E o Espírito Santo é todo o ser divino.” (“Teologia Sistemática” – p. 187).

Robert M.Bowman Jr, em seu livro “Por que devo crer na Trindade” (p. 13), salientou:

“(...) Outro aspecto importante sobre a unicidade de Deus é o fato de que não há separações, divisões ou repartições em Deus. A doutrina Trinitarista sustenta que Deus é um ser infinito, único, que transcende os limites do espaço e do tempo, que não possui corpo material nem espiritual (a não ser o corpo que o Filho tomou sobre Si ao tornar-se homem). O Deus trino, portanto, não tem partes. Não se pode dividir em componentes a existência infinita (...)”.

A existência de três pessoas distintas na Divindade não enseja que cada uma seja separada das outras, assim como os seres humanos possuem a mesma essência humana, mas são separados uns dos outros, não formando, assim, um único ser, apesar da mesma natureza.

A natureza divina, ao contrário da nossa natureza humana limitada e finita, pode subsistir em Sua plenitude, sem divisões e de forma infinita em mais de uma pessoa, pois cada uma das pessoas da Divindade possui a mesma substância ou essência, o que torna Deus um único Ser, daí existir em Deus uma única vontade, uma só glória.

No livro “Prayer and Revelation” (p. 5), de Vincent Cheung presidente da Reformation Ministries International (Ministério Reformado Internacional), temos algumas considerações sobre a expressão “essência” e que “três pessoas” define o verdadeiro Ser de Deus assim como “dois rins” define um ser humano normal:

“Pela palavra ‘essência’ nos referimos aos atributos de Deus, tais como Sua onipotência e onisciência (...) Assim, Deus tem uma definição, mas há três pessoas que completamente e igualmente participam desta definição. Contudo, isto não se traduz em politeísmo. O exposto acima não nos compele a afirmar a existência de três Deuses distintos e independentes. E isto porque o Deus da Bíblia é, por definição, uma Trindade; portanto, uma Trindade constitui somente um Deus. Por exemplo, se por definição um corpo humano normal inclui dois rins, então, o fato de que eu tenha dois rins não significa que eu consisto de dois corpos humanos. Visto que por definição cada corpo humano tem dois rins, o próprio fato de que eu tenha dois rins significa que eu tenho um corpo humano normal. Da mesma forma, a definição bíblica da deidade é que Deus é uma Trindade, assim, se há uma Trindade de pessoas divinas, há um Deus. Não há outro Deus além do Deus da Bíblia, e o Deus da Bíblia é uma Trindade. Por si mesma, esta doutrina separa o Cristianismo de todas as outras cosmovisões e filosofias, sejam religiosas ou seculares (...)” (fonte: http://www.monergismo.com/).

Diante de tudo que temos observado, podemos afirmar que:

“(...) Há uma intercomunhão de pessoas e uma imanência de uma pessoa divina na outra que permite a obra peculiar atribuir-se, com uma simples limitação, a qualquer uma das outras e a manifestação de uma se reconheça na manifestação de outra (...)” (Strong, “Teologia Sistemática”, p. 494).

Strong, ainda na mesma obra trouxe as seguintes afirmações complementares:

"[...] Jo 17:11,22 – ‘para que sejam um, assim como nós’ – [...] não unus, mas unum; não uma pessoa, mas uma substância (...)” (p. 465).

Portanto, cada membro da Trindade, em um sentido misterioso, habita no outro, sem qualquer diminuição da total pessoalidade de cada um.

O Pastor Isaías Lobão Pereira Júnior, em seu artigo “A doutrina da Trindade”, considerou sobre o termo latim “pericórese” que expressa a comunhão existente na Divindade (http://www.monergismo.com/textos/trindade/trindade_isaias.htm):

“O termo usado para explicar a comunhão das Pessoas da Trindade é pericórese, (latim, circumincessio). O sentido seria o fato de envolver - circum - e entrar numa profunda intimidade.”

CONSCIÊNCIA E AUTOCONSCIÊNCIA

Vamos estudar também os conceitos de “consciência” e “autoconsciência” e suas implicações na pessoalidade humana e na tri-pessoalidade divina. Héber Carlos de Campos afirmou, em seu livro “o Ser de Deus e os seus atributos” (pp. 101-102):

“Há uma distinção importante entre consciência e autoconsciência. Na consciência, o objeto é uma outra coisa ou ser que existe além do sujeito. O objeto de conhecimento é distinto do sujeito. Contudo, na autoconsciência, o objeto de conhecimento é da mesma substância do sujeito. Conhecer algo fora de nós mesmos é muito mais fácil do que o conhecimento de nós próprios. A auto-inspeção é muito mais difícil do que a inspeção de algo que não nós mesmos. No ato da auto-inspeção, não há a realidade objetiva que podemos contemplar. No ato da autoconsciência é a mesma alma individual que percebe e é percebida. Não há diferença entre o pesquisador e o pesquisado. Toda consciência implica um sujeito e um objeto. Na autoconsciência não há diferença entre os dois. Este é o poder que o espírito racional possui, diferentemente dos animais irracionais. Se o homem perde essa capacidade, ele deixa de ser homem. Deus, que é Espírito supremo, possui esta capacidade de autoconsciência num grau infinitamente maior, e, portanto, perfeito. É este poder que Deus possui, em grau de perfeição, de fazer-se a si mesmo seu próprio objeto de conhecimento, sendo um ser eminentemente pessoal; na verdade, tripessoal”.

Analisando deste ponto de vista, torna-se mais acessível às nossas mentes limitadas compreender melhor o Ser triúno de Deus: A Sua autoconsciência é infinitamente superior a nossa e, portanto, perfeita, permitindo a Ele facilmente contemplar a Si mesmo, em Sua única e indivisível essência, como um tripersonalidade.

Ainda baseados nas sábias considerações de Campos neste citado livro (pp. 102-103), podemos citar, mesmo que resumidamente, a comparação que o mesmo apresentou entre Deus, os seres humanos e os animais irracionais:

1º) O animal irracional possui uma consciência (percepção ou sensação) de objetos que estão em torno de si, limitada, ele não diferencia exatamente o que ou quem são estes tais objetos, mesmo que lhe pareçam “familiares”. Todavia, ele não possui consciência de si mesmo. Ele até se impressiona com objetos ao seu redor (não participantes da sua essência), mas nunca se impressiona consigo mesmo. Se colocarmos o animal irracional diante de um espelho, ele não entenderá que o que está observando é sua própria imagem. Ele nunca se contempla, mas é capaz de contemplar os outros, mesmo que não possa fazer as devidas distinções. Esse comportamento se deve ao fato de que ele não é uma pessoa. Ele possui a consciência das coisas ao seu redor, mas não possui autoconsciência.

2º) O ser humano possui consciência no sentido de perceber as coisas que estão ao seu redor, no entanto, o que o difere do animal irracional é que o homem é capaz de se contemplar e de entender que aquele que está refletindo no espelho é ele próprio, e não alguma outra coisa que o impressiona. Diferentemente dos animais irracionais, o homem pode ter pensamentos e sentimentos espontâneos, sem que precise exercitar sua mente ou suas emoções. A autoconsciência é mais profunda do que a consciência. Todo homem tem consciência de que comete erros, mas somente quando o Espírito Santo o convence dos seus pecados é que ele passa a exercer a autoconsciência do que é e do que faz.

3º) Ao contrário dos animais racionais e irracionais, Deus não possui a mesma espécie de consciência, porque existe antes que qualquer coisa que não Ele mesmo. Ele não precisa desse tipo de consciência para ser o que é. Deus não tem corpo, partes e nem é afetado por nada que não seja Ele próprio. Ele é auto-existente e independente de tudo o que há na criação, porque já era antes de ela vir a existir. O Ser divino, em contraste com os seres humanos, não possui a autoconsciência que provém da mera consciência, nem possui um processo mental irrefletido, como é próprio da mente humana. Nada vem à Sua mente de maneira irrefletida, espontânea, sem que tenha sido desejado e planejado por Ele. Ele sempre exercita a Sua mente naquilo que pensa. Em nós, pode haver uma distinção entre consciência e autoconsciência, mas não em Deus.

Essas duas coisas são absolutamente unidas, e é difícil entender a autoconsciência em Deus em virtude de Sua natureza pessoal ser muito superior e mais complexa do que a nossa. Sendo assim, a autoconsciência em Deus é perfeita e tem um grau bem mais elevado que nos homens ou nos anjos, que são os seres racionais criados. Héber Campos ainda salientou (pp. 103-104):

“É aqui que a doutrina da Trindade derrama algum tipo de luz sobre esse profundo mistério da autoconsciência divina. Deus é um ser tripessoal, sendo que as três pessoas compartilham da mesma essência divina. A revelação das Escrituras mostra a Deus como aquele que ‘é bendito eternamente’, sendo absolutamente independente, tendo vida própria, possuindo todas as características de um ser pessoal, que vive relacionando-se. Portanto, como tal, ele deve possuir todas as propriedadas dentro de si mesmo, e não fora do seu próprio ser, porque ele já era antes de todas as outras coisas virem a ser. Ele nunca precisou do universo para poder relacionar-se. Essa faculdade é encontrada dentro do seu próprio ser, que subsiste tripessoalmente. Ele não precisa conhecer a sua criação a fim de que possa ter um objeto para conhecer e amar, e com quem possa regozijar-se e ter comunhão. Isso Ele faz dentro do próprio ser divino. Essa propriedade é impossível para o homem, que é unipessoal. A fim de que ele possa relacionar-se, amar e ter alegria, tem que haver uma outra pessoa. Por essa razão, Deus fez Eva para servir de companhia para Adão. Deus não precisava de ninguém para ser o que é. Ele não precisa de ninguém além de si próprio. Ele se basta a si mesmo, por que é tripessoal (...) Deus tem uma perfeita autoconsciência. Antes mesmo que houvesse qualquer outra coisa além do ser divino, as pessoas da Trindade já se relacionavam, tendo amor uma pela outra e alegrando-se mutuamente. Esta relação se dava dentro da essência divina. A autoconsciência divina é diferente e superior em Deus porque ele é independente de qualquer outro ser para relacionar-se (...)”.

A Confissão de Fé de Westminster, comenta sobre a independência e auto-suficiência divina. No seu Capítulo II, que trata “De Deus e da Santíssima Trindade”, no artigo 2º, ela afirma:

“II) Deus tem em si mesmo, e de si mesmo, toda a vida, glória, bondade e bem-aventurança. Ele é todo-suficiente em si e para si, pois não precisa das criaturas que trouxe à existência; não deriva delas glória alguma, mas somente manifesta a sua glória nelas, por elas, para elas e sobre elas. Ele é a única origem de todo ser; dele, por ele e para ele são todas as coisas e sobre elas tem ele soberano domínio para fazer com elas, para elas e sobre elas tudo quanto quiser (...)” (p. 30).

Como referências para as declarações deste parágrafo a CFW utilizou: Sl 119:68; 145:17; Pv 15:3; Jo 5:26; At 7:2; 15:18; Rm 11:33-34,36; 17:24-25; 1Tm 6:15; Hb 4:13; Ap 4:11; 5:12-14.

Ainda sobre “consciência” e “autoconsciência”, Louis Berkhof apresentou importantíssimas considerações que irão complementar o que já temos observado:

“Shedd baseia o seu argumento na autoconsciência geral do Deus triúno, como distinta da autoconsciência individual e particular de cada uma das Pessoas da Divindade, pois na autoconsciência o sujeito tem que se conhecer a si mesmo como objeto, e também percebe que o faz. Isso é possível em Deus em razão de Sua existência trina. Argumenta Shedd que Deus não poderia contemplar-se a Si mesmo, conhecer-se e comunicar-se consigo mesmo, se não fosse trino em sua constituição. Bartlett apresenta de maneira interessante várias considerações para provar que Deus é necessariamente tripessoal. A argumentação que parte da personalidade, para provar ao menos que há pluralidade em Deus, pode ser expressa de forma semelhante a esta: Entre os homens o ego só se desperta para a consciência por meio do contato com o não-ego. A personalidade não se desenvolve nem existe na isolação, mas somente associada a outras pessoas. Daí, não é possível conceituar a personalidade de Deus independentemente de uma associação de pessoas iguais nele. Seu contato com Suas criaturas não explica a Sua personalidade, do mesmo modo como o contato do homem com os animais não explica a sua personalidade. Em virtude da existência tripessoal de Deus, há uma infinita plenitude da vida divina nele (...)" [Shedd: Dogm. Theol. I, pp. 393,394,251 e seguintes, 178 e seguintes; Bartlett: The Triune God, Part Two].- (citado em “Teologia Sistemática”, p. 81).

Um ser vivo racional, portanto, só desenvolve sua personalidade com a convivência com uma outra personalidade do mesmo nível de existência. Por exemplo, a personalidade humana não se desenvolve em contato com um animal irracional (inferior), mas, em contato com outro ser humano. A personalidade divina não se desenvolveu em contato com a personalidade humana (inferior), aliás, ela existe eternamente, inclusive relacionando-se entre si com outras personalidades também divinas, isto é, as três pessoas da Santíssima Trindade.

sábado, 20 de novembro de 2010

A DOUTRINA TRINITARIANA E OS CREDOS ECLESIÁSTICOS

Apresentaremos a seguir os Credos elaborados através da história pela Igreja (o texto dos dois primeiros foi apresentado por Wayne Grudem em sua Teologia Sistemática).

CREDO APOSTÓLICO
(Séculos III e IV)

“Creio em Deus, o Pai Todo-Poderoso, Criador do céu e da terra. E em Jesus Cristo, seu Filho unigênito, nosso Senhor, concebido pelo Espírito Santo e nascido da Virgem Maria; que padeceu sob Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado(*), e ao terceiro dia ressurgiu dos mortos; que subiu ao céu e assentou-se à direita do Pai Todo-Poderoso, de onde há de vir para julgar os vivos e os mortos. Creio no Espírito Santo, na santa igreja católica [universal], na comunhão dos santos, na remissão de pecados, na ressurreição da carne e na vida eterna. Amém” [citação minha entre colchetes].

Comentários do Centro Apologético Cristão de Pesquisas a respeito do Credo Apostólico:

“Por ser uma das primeiras partes da literatura confessional que se aprende, o Credo Apostólico é o credo mais usado em nossa igreja. E, exceto a oração do Senhor (dominical), não há conjunto de palavras na Igreja Cristã que os cristãos mais pronunciem. Ele é o primeiro dos credos ecumênicos [...] Apesar de receber o nome de Apostólico, não temos nenhuma evidência de que foi escrito pelos próprios apóstolos ou por alguns deles. O título ‘Credo Apostólico’ foi usado pela primeira vez em 390, no Sínodo de Milão. Em 404, Tirano Rufino escreveu um comentário do credo, contando a história de sua provável origem (de que no dia de Pentecostes os apóstolos, antes de cumprir a ordem de ir aos confins da terra, teriam se reunido e cada um contribuído com alguma parte do credo). Há evidência, no entanto, de que um credo muito semelhante a este já era usado no ano 150. A verdade, talvez, nunca se saberá. Entretanto, ninguém de sã consciência negará que esse credo reproduz autenticamente o ensino dos apóstolos, fundamentado nas verdades das Escrituras (1 Co 8.6; 12.13; Fp 2.5-11; 1 Tm 2.4-6; 1 Tm 3.16)”.

Já o Rev. Hermisten M. P. da Costa trouxe outras considerações importantes sobre este Credo no livro “Eu creio no Pai, no Filho e no Espírito Santo”:

"O Credo dos Apóstolos tem sua origem no Credo romano Antigo, elaborado no segundo século, tendo algumas declarações doutrinárias acrescentadas no decorrer dos primeiros séculos, chegando à sua forma como temos hoje por volta do sétimo século [...] O Credo Apostólico era usado na preparação dos catecúmenos, professado durante o batismo, servindo também para a devoção privada dos cristãos. Posteriormente passou a ser recitado com a Oração do Senhor no culto público. No nono século, ele foi sancionado pelo Imperador Carlos Magno para uso na Igreja, e o papara o incorporou à liturgia romana. A Reforma valorizou este Credo, sendo ele usado liturgicamente em muitas de nossas igrejas ainda na atualidade.” (pp. 29-30).

CREDO DE NICÉIA
(ou Niceno-Constantinopolitano: 325 A.D. – revisado em Constantinopla em 381 A.D.)

“Cremos em um só Deus, Pai, Todo-Poderoso, Criador de todas as coisas, visíveis e invisíveis. E em um só Senhor Jesus Cristo, o unigênito Filho de Deus, gerado pelo Pai antes de todos os séculos, Luz da Luz, verdadeiro Deus de verdadeiro Deus, gerado, não criado, de uma só substância com o Pai, pelo qual todas as coisas foram feitas; o qual, por nós homens e por nossa salvação, desceu dos céus, foi feito carne pelo Espírito Santo e da Virgem Maria, e tornou-se homem, e foi crucificado por nós sob Pôncio Pilatos, e padeceu e foi sepultado e ressuscitou ao terceiro dia, conforme as Escrituras, e subiu aos céus e assentou-se à direita do Pai, e de novo há de vir com glória para julgar os vivos e os mortos, e o seu reino não terá fim. E no Espírito Santo, Senhor e Vivificador, que procede do Pai e do Filho(**), que com o Pai e o Filho conjuntamente é adorado e glorificado, que falou através dos profetas. E na igreja una, santa, católica [universal] e apostólica. Confessamos um só batismo para remissão dos pecados. Esperamos a ressurreição dos mortos e a vida do século vindouro. Amém.” [citação nossa entre colchetes].

Comentários do Centro Apologético Cristão de Pesquisas a respeito do Credo de Nicéia ou Credo Niceno:

“Enquanto a Igreja Cristã se desenvolvia, passou a sofrer oposição de Roma e dos judeus em forma de perseguições e morte aos que professavam a fé cristã. Mas este não foi o único tipo de perseguição sofrida. Apesar da igreja primitiva ter recebido aceitação social e respeitabilidade durante o governo do Imperador Diocleciano (284-305), um outro tipo de perseguição começou a se infiltrar na Igreja – o da oposição à fé como revelação direta da verdade por parte de Deus. A origem do Credo Niceno se encontra na necessidade que houve de defender a doutrina apostólica da divindade de Cristo contra Ário, e da divindade do Espírito Santo contra os seguidores de Macedônio. Convocou-se um concílio na cidade de Nicéia para maio e junho de 325. 220 bispos estavam presentes [...] Além, de Ário, apenas 5 outros se recusaram a assinar o documento elaborado em Nicéia. O Imperador os baniu, mas sem grande interesse político. O mesmo credo foi reafirmado no Concílio de Constantinopla, em 381, e foi oficialmente adotado com alguns acréscimos em 451 [...]”

O Rev. Hermisten trouxe as seguintes considerações sobre este Credo (em “Eu creio no Pai, no Filho e no Espírito Santo”):

“O Credo Niceno Constantinopolitano é usado liturgicamente pela Igreja romana e pelas Igrejas Luteranas e Anglicanas. As Igrejas Reformadas o usam pouco. Ele é sem dúvida um dos mais importantes Credos da Igreja Cristã.” (p. 35).

O Centro Apologético Cristão de Pesquisas ainda nos apresenta o chamado Credo de Cesaréia:

CREDO DE CESARÉIA

“Cremos em um só Deus, Pai onipotente, criador de todas as coisas visíveis e invisíveis; e em um só Senhor, Jesus Cristo, Verbo de Deus, Deus de toda a criação, por quem foram feitas todas as coisas; o qual foi feito carne para nossa salvação, tendo vivido entre os homens. Sofreu, ressuscitou ao terceiro dia, subiu ao Pai e novamente virá em glória para julgar os vivos e os mortos. Cremos também em um só Espírito Santo”.

Talvez o Credo mais importante em referência à Trindade seja o Atanasiano. Os textos e comentários que se seguem são do Centro Apologético Cristão de Pesquisas:

CREDO ATANASIANO

“Todo aquele que quer ser salvo, antes de tudo deve professar a fé católica [universal]. Quem quer que não a conservar íntegra e inviolada, sem dúvida perecerá eternamente. E a fé católica [universal] consiste em venerar um só Deus na Trindade e a Trindade na unidade, sem confundir as pessoas e sem dividir a substância. Pois uma é a pessoa do Pai, outra a do Filho, outra a do Espírito Santo; Mas uma só é a divindade do Pai e do Filho e do Espírito Santo, igual a glória, coeterna a majestade. Qual o Pai, tal o Filho, tal também o Espírito Santo. Incriado é o Pai, incriado o Filho, incriado o Espírito Santo. Imenso é o Pai, imenso o Filho, imenso o Espírito Santo. Eterno o Pai, eterno o Filho, eterno o Espírito Santo; Contudo, não são três eternos, mas um único eterno; Como não há três incriados, nem três imensos, porém um só incriado e um só imenso. Da mesma forma, o Pai é onipotente, o Filho é onipotente, o Espírito Santo é onipotente; Contudo, não há três onipotentes, mas um só onipotente. Assim, o Pai é Deus, o Filho é Deus, o Espírito Santo é Deus; E todavia, não há três Deuses, porém um único Deus. Como o Pai é Senhor, assim o Filho é Senhor, o Espírito Santo é Senhor; Entretanto, não são três Senhores, porém um só Senhor. Porque, assim como pela verdade cristã somos obrigados a confessar que cada pessoa, tomada pela verdade cristã somos obrigados a confessar que cada pessoa, tomada em separado, é Deus e Senhor, assim também estamos proibidos pela religião católica de dizer que são três Deuses ou três Senhores. O Pai por ninguém foi feito, nem criado, nem negado. O Filho é só do Pai; não feito, nem criado, mas gerado. O Espírito Santo é do Pai e do Filho; não feito, nem criado, nem gerado, mas procedente. Há, portanto, um único Pai, não três Pais; um único Filho, não três Filhos; um único Espírito Santo, não três Espíritos Santos. E nesta Trindade nada é anterior ou posterior, nada maior ou menor; porém todas as três pessoas são coeternas e iguais entre si; de modo que em tudo, conforme já ficou dito acima, deve ser venerada a Trindade na unidade e a unidade na Trindade. Portanto, quem quer salvar-se, deve pensar assim a respeito da Trindade. Mas para a salvação eterna também é necessário crer fielmente na encarnação de nosso Senhor Jesus Cristo. A fé verdadeira, por conseguinte, é crermos e confessarmos que nosso Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, é Deus e homem. É Deus, gerado da substância do Pai antes dos séculos, e é homem, nascido, no mundo, da substância da mãe. Deus perfeito, homem perfeito, subsistindo de alma racional e carne humana. Igual ao Pai segundo a divindade, menor que o Pai segundo a humanidade. Ainda que é Deus e homem, todavia não há dois, porém um só Cristo. Um só, entretanto, não por conversão da divindade em carne, mas pela assunção da humanidade em Deus. De todo um só, não por confusão de substância, mas por unidade de pessoa. Pois, assim como a alma racional e a carne é um só homem, assim Deus e homem é um só Cristo; o qual padeceu pela nossa salvação, desceu aos infernos, ressuscitou dos mortos, subiu aos céus, está sentado à destra do Pai, donde há de vir para julgar os vivos e os mortos. À sua chegada todos os homens devem ressuscitar com os seus corpos e vão prestar contas de seus próprios atos; E aqueles que tiverem praticado o bem irão para a vida eterna; aqueles que tiverem praticado o mal irão para o fogo eterno. Esta é a fé católica [universal]. Quem não a crer com fidelidade e firmeza, não poderá salvar-se.” [citações minhas entre colchetes].

Comentários:

“O Credo Atanasiano é uma confissão magnífica sobre o Deus triúno. Lutero o considerou ‘a maior produção da igreja desde os tempos dos apóstolos’. A origem do credo é, entretanto, obscura. Desde o século IX alguns o atribuíram a Atanásio, o heróico defensor da doutrina da divindade de Cristo contra Ário. Entretanto, não há razões muito fortes para que se possa atribuí-lo a Atanásio: 1. Não há evidências de que Atanásio e seus contemporâneos tivessem tomado conhecimento desse credo (também chamado ‘Quicunque’ – pois ele inicia com estas palavras: ‘Todo aquele....’). 2. Ele ataca heresias que surgiram depois da morte de Atanásio, quando Nestório e Éutico introduziram heresias sobre a Trindade e a pessoa de Cristo. 3. É bem provável que o autor desse credo era versado nos escritos de Agostinho, que viveu entre 354 e 430. Mas se Atanásio não foi o autor, quem foi? A questão tem intrigado os estudiosos da história cristã ao longo de todos esses anos. O mais próximo que chegaram, baseados em evidências encontradas, foi de que se conhecia um credo semelhante a esse na Galiléia (hoje França) na metade do 5° século. Entretanto, só se tornou popular para fins de instrução após Carlos Magno (742-814) ter decretado que todos os clérigos tinham que aprendê-lo. O Credo Atanasiano nunca teve um uso generalizado como os outros 2 credos [...]”.

Observemos mais uma vez as considerações do Rev. Hermisten, agora sobre o Credo Atanasiano (livro “Eu creio no Pai, no Filho e no Espírito Santo”):

"Apesar de várias hipóteses quanto à sua autoria [...] ninguém conseguiu provar de modo incontestável a identidade do seu autor. A ênfase deste Credo é a defesa da Cristologia e da doutrina da Trindade conforme foram definidas nos Concílios Nicéia (325), Constantinopla (381) e Calcedônia (451), refletindo visivelmente a teologia de Agostinho (354-430). Ele foi amplamente considerado na Idade Média: na Igreja latina era quase que diariamente usado nas devoções matinais e, ao que parece, também tinha funções catequéticas. Os Reformadores o apreciaram bastante (tanto Lutero como Calvino) [...]” (p. 31).

Nas próximas postagens trataremos, entre outras coisas, de inúmeros conceitos teológicos mais complexos baseadas na doutrina trinitariana, para complementar e aprofundar mais o nosso conhecimento neste estudo, antes de atingirmos o ponto mais alto do mesmo, que é a relevância e a praticidade desta doutrina para nós diante do mundo moderno e corrupto e as bênçãos de uma íntima comunhão com o nosso Deus.

Que o nosso Deus triúno seja glorificado pelos séculos dos séculos. Amém.

 
________________________________________
Notas:


(*) Wayne Grudem não incluiu a frase “desceu ao inferno”, porque segundo ele, a mesma “não é confirmada nas versões mais antigas do Credo Apostólico e por causa das dificuldades doutrinárias associadas com ela” (p. 1038).

(**) Segundo Grudem a cláusula filioque, ou seja, “a frase ‘e do Filho’ foi acrescentada depois do Concílio de Constantinopla em 381, mas é normalmente incluída no texto do Credo de Nicéia usado pelas igrejas católicas e protestantes hoje. A frase não aparece no texto usado pelas igrejas ortodoxas (...) A frase ‘Deus de Deus’ não estava na versão de 381, mas somente na de 325 e é normalmente incluída hoje” (p. 1038).Fonte dos comentários do Centro Apologético Cristão de Pesquisas – CACP:



Sendo que o CACP teve como fontes: http://www.icp.com.br e http://www.ielb.org.br/cremos/credos.htm).

Ainda sobre o Credo Atanasiano ver também o site da Biblioteca Reformada - ARPAV: http://www.geocities.com/arpav/biblioteca/credoatanasio.html.

O texto dos Credos apresentados por Wayne Grudem foram extraídos do livro “Teologia Sistemática”, pp. 996-997.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

UM POUCO DA HISTÓRIA DA DOUTRINA TRINITARIANA

CRÍTICAS E HERESIAS IMPULCIONARAM A FORMULAÇÃO DA DOUTRINA DA TRINDADE

A doutrina da Trindade é uma influência do paganismo?

Muitas pessoas acusam a doutrina trinitariana de ter se originado das religiões pagãs da antiguidade, o que não é verdade.

Charles Hodge em sua Teologia Sistemática (p. 333), afirmou que:

“[...] A doutrina da Trindade é peculiar à religião da Bíblia. A Tríade do mundo antigo não passa de uma afirmação filosófica da teoria panteísta que é a base de todas as religiões da antiguidade. Para os hindus, o ser simples, não desenvolvido e primário é chamado de Brahma. Esse ser, revelado no mundo real, é Vishnu; quando retornar ao abismo da consciência ou atributos, é Shiva. No budismo, encontramos essencialmente as mesmas idéias, em uma forma mais dualista. O budismo estabelece uma distinção mais forte entre Deus, ou princípio espiritual de todas as coisas, e a natureza. A alma do homem é uma parte, ou uma forma de existência, dessa essência espiritual, cujo destino consiste em poder livrar-se da natureza e perder-se no infinito ignoto. No platonismo também encontramos uma trindade irreal [...] Em todos esses sistemas, antigos ou modernos, há uma Tese, uma Antítese e uma Síntese; o Infinito se torna finito, e o finito volta para o Infinito. É óbvio, pois, que tais fórmulas trinitarianas não têm analogia oom a doutrina bíblica da Trindade, e não servem nem para explicá-la nem para confirmá-la [...]”

Observemos mais algumas declarações que fortalecem o conceito de que a doutrina trinitariana não possui origem pagã:

"[...] Equivalência Pagã: Outros movimentos que, embora não sejam reconhecidos como cristãos pelas grandes denominações cristãs, se auto-denominam de cristãos, bem como alguns movimentos pára-cristãos, afirmam que a Trindade é o fruto da importação de conceitos religiosos pagãos, e ainda uma fabricação da Igreja do século IV. A este respeito, porém, é hoje consensual entre os especialistas em História das Religiões que nas outras religiões - em especial a religião Egípcia e a religião Hindú - não se encontra a afirmação da «subsistência de um Deus em três Pessoas distintas» - crença peculiar e restrita ao cristiansmo trinitário -, mas tão só a reunião de três deuses distintos de entre um vasto panteão, ou de três avatáres, respectivamente (Refª Henri-Charles Puech – ‘Histoire des religions’, T1. T2, 1999; Konemann Verlag – ‘Histoire des religions’, 1997) [...]” (Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Cr%C3%ADticas_%C3%A0_doutrina_da_Trindade).

Aldo Menezes em seu livro “As Testemunhas de Jeová e a Trindade” (p. 38), afirmou que:

“[...] A objeção de que a doutrina da Trindade é de origem pagã, uma vez que cultuavam as tríades de deuses, também não faz sentido, pois a concepção pagã em nada se assemelha à doutrina trinitária. Os pagãos são politeístas, ou seja, crêem na existência de vários deuses, e a trindade é mais um conjunto de deuses em seu panteão [...]”

A doutrina da Trindade é uma invenção da Igreja do 4º século?

Quanto à acusação da doutrina trinitariana ser uma invenção da Igreja no quarto século, ou seja, centenas de anos após o período apostólico, vejamos estas declarações:

“[...] Quanto à datação da doutrina da Trindade como tendo surgido somente no século IV, as práxis sacramentais e os escritos cristãos dos três primeiros séculos - sobretudo Orígenes, Teófilo de Antioquia, Justino, Hipólito e Tertuliano - são testemunhos suficientes para se ser ter uma posição de grande renitência, senão mesmo de rejeição, quanto à veracidade de tal afirmação (Refª Mircea Eliade - "Traité d'histoire des religions", 2004). Na realidade, se a formulação dogmática da referida doutrina só foi postulada no decorrer dos grandes concílios ecumênicos do referido século IV, a sua crença é-lhe anterior, podendo a sua gênese remontar aos próprios escritos do Novo Testamento [...]“ (http://pt.wikipedia.org/wiki/Cr%C3%ADticas_%C3%A0_doutrina_da_Trindade).

Como se deu, portanto, o desenvolvimento da doutrina trinitariana através dos séculos, inclusive desde o fim do período apostólico, é o que iremos observar a seguir.

Guerras em nome da Trindade?

A alegação de que em nome da doutrina trinitariana na história do cristianismo foram promovidas muitas guerras e muito derramamento de sangue deve ser questionada. Será mesmo justo condenar uma doutrina claramente apresentada na Bíblia (como vimos anteriormente) apenas pelo fato lamentável de que algumas pessoas que se diziam “cristãs” tiveram um comportamento nada cristão, cometendo crimes absurdos em nome desta doutrina?

Sobre esta questão, Robert M. Bowman Jr em seu livro “Por que devo crer na Trindade” (pp. 157-158), afirmou:

“[...] Outra coisa que confunde a questão em debate é a referência aos trinitários que têm perseguido antitrinitários. Embora tal coisa tenha acontecido, não foi como resultado da crença na Trindade, mas por sustentar a crença que o governo civil tinha a responsabilidade de castigar ou até mesmo de executar hereges. Quando e onde antitrinitários estavam no governo e sustentando uma crença semelhante a respeito do papel das autoridades civis, freqüentemente eram perseguidos os trinitários. Logo, a perseguição histórica de antitrinitários por trinitários, por lamentável que tenha sido, não refuta de nenhuma maneira a doutrina da Trindade [...] Ainda menos relevante é a história lastimável de guerras em que trinitários têm matado trinitários. Quer concordemos ou não com a premissa de que toda a participação na guerra é um pecado (premissa com que concordam alguns cristãos, mas não todos), o fato de alguns trinitários terem matado outros na guerra, embora seja lamentável, não serve de refutação da doutrina da Trindade. No máximo, serve de prova de que a crença na doutrina da Trindade, por si só, não garante que a conduta da pessoa, ou a conduta de nações inteiras que aceitam essa doutrina, seja consistentemente cristã. Mas simplesmente não existe conexão lógica entre a crença na Trindade e a participação na guerra. Essas são questões separadas, e tentar alegar que a verdade da Trindade é suspeita por causa das crenças a respeito da participação na guerra é simplesmente confundir a questão [...]”

Portanto, alguns fatos realmente lamentáveis podem até ter “manchado” a história dos trinitaristas, devido à atitudes desumanas, mas jamais “mancharia” a história do trinitarismo, pois em nenhum momento ofuscou ou invalidou a veracidade da sã doutrina da Santíssima Trindade revelada na Bíblia, de Gênesis à Apocalipse.

AS TRÊS PRINCIPAIS HERESIAS CONTRA A DOUTRINA TRINITARIANA

Desde os primeiros séculos da igreja a doutrina trinitariana passou por um desenvolvimento, seja por considerações mais elaboradas do Credo Apostólico, seja por meio dos Credos dos primeiros concílios ecumênicos (Nicéia, em 325, Constantinopla, em 381), sem falar do Credo de Atanásio, todos eles compelidos por controvérsias doutrinárias significativas em torno de três principais movimentos heréticos:

1) o Monarquismo (a crença em um Deus não apenas unitário, mas unipessoal e não tripessoal), dividido em monarquismo modalista, e monarquismo dinâmico.

O modalista surgiu com uma tendência de acreditar em Cristo como um ser divino, mas não distinto do Pai e do Filho, negando a sua plena humanidade (docetismo). Também acreditava na unicidade de Deus, porém que a Trindade são modos de Deus cronologicamente de expressar ao mundo (nunca simultaneamente, mas sucessivamente). Teve como expoentes Noeto (c. 200), Práxeas (c.200) e Sabélio (c. 215), todos de Roma.

Já o monarquismo dinâmico teve como expoente Paulo de Samosata (260) e possuía uma tendência ebionita, ou seja, negava a divindade essencial de Jesus. Acreditava na unicidade de Deus, mas que Jesus e o Espírito não são pessoas distintas, pois Cristo (o Filho de Deus adotado neste caso por Deus, pois seria meramente homem) receberia o Espírito Santo que seria apenas um atributo de Deus, o "dynamis" de Deus(do grego: "poder"), no Seu batismo, O elevando a categoria de divino.

2) O Arianismo. O seu originador foi Ário (250-336), presbítero de Alexandria. Para Ele apenas Deus Pai é verdadeiramente Deus, mas não foi sempre Pai. Em um determinado tempo Ele “criou” o Filho. Apesar de crer na unicidade de Deus, não acreditava que Seus atributos fossem compartilhados por outras pessoas na Divindade, isso seria politeísmo para ele. Ele (Ário) e seus discípulos enfatizavam o fato de que Jesus foi um ser humano perfeitíssimo, porque Ele estava cheio do Espírito Santo.

É possível, inclusive, observar uma influência significativa do pensamento filosófico grego em Ário. Para ele, o "Logos" relatado no evangelho de João não é Deus, pois, Deus não pode se comunicar com o mundo, por ser um mistério indecifrável e alienado demais de Sua criação. A natureza de Deus, portanto, neste caso, seria incomunicável. Este "Logos" não seria Deus, mas seria um elemento participante da natureza divina. Jesus, cheio do Espírito, alcançou a perfeição, segundo esta doutrina, a ponto de merecer um nome divino. Jesus, então, teria sido adotado pelo Pai como seu filho, sendo eternamente subordinado ao Pai, por ter sido criado ou gerado pelo Pai.

O Concílio de Nicéia (325) refutou a doutrina de Ário, afirmando que Jesus Cristo é o único Filho de Deus (mais adiante transcreveremos o conteúdo dos Credos da Igreja).

3) O Macedonianismo. Ao contrário dos demais movimentos heréticos semelhantes, a questão primordial deste refere-se diretamente a divindade do Espírito Santo, pois, acreditava que Ele era uma espécie de energia oriunda de Deus.

À despeito de conflitos ocorridos entre trinitários e antitrinitários e até mesmo entre os trinitários, a maior luta da Igreja Cristã através dos séculos em relação à doutrina da Trindade foi no campo dogmático. Foram necessários séculos de confrontação doutrinal até que os representantes eclesiásticos tivessem condições de oferecer um sistema expositivo desta doutrina que pudesse não somente ser aceito pela Igreja, mas principalmente com total respaldo bíblico.

Vejamos algumas declarações que nos ajudam a entender melhor a história da doutrina da Trindade:

“[...] A doutrina trinitariana defende que há inúmeros trechos da Bíblia em que as chamadas ‘Pessoas da Trindade’ são referidas distintamente em suas ações [..] Historicamente, um dos primeiros a utilizar esta definição foi Tertuliano, na sua obra Adversus Praxeas, onde ele utilizou o termo ‘trinitas’. Esta perspectiva foi postulada como um artigo de fé pelo credo de Nicéia (proclamado em 325 no Concílio de Niceia) e o credo de Atanásio (cerca de 500 d.C.) [...] Estes credos foram formulados e ratificados pela Igreja dos séculos III e IV, em reação a noções algumas delas envolvendo a natureza da Trindade e a posição de Cristo nela, como as do arianismo, que foram depois declaradas como heréticas. Os credos foram mantidos em alguma forma pela maioria das igrejas protestantes, sendo até mesmo citados na liturgia de igrejas luteranas e Igrejas Reformadas [...] O Credo Niceno-Constantinopolitano, ou o Ícone/Símbolo da Fé, é uma declaração de fé cristã que é aceita pela Igreja Católica Romana, pela Igreja Ortodoxa Oriental, pela Igreja Anglicana e pelas principais igrejas protestantes. O nome está relacionado com o Primeiro Concílio de Niceia (325), no qual foi adaptado, e com o Primeiro Concílio de Constantinopla (381), onde foi aceita uma versão revista. Por esse motivo, ele pode ser referido especificamente como o Credo Niceno-Constantinopolitano para o distinguir tanto da versão de 325 como de versões posteriores que incluem a cláusula filioque [sobre esta cláusula veja os comentários sobre o Credo de Nicéia]. Houve vários outros credos elaborados em reação a doutrinas que apareceram posteriormente como heresias, mas este, na sua revisão de 381, foi o último em que as comunhões católica e ortodoxa conseguiram concordar em todos os pontos (Esta composição do credo pode ser encontrada nas atas dos Concílios Ecumênicos de Éfeso e Calcedônia; na Carta de Eusébio de Cesareia à sua própria igreja; na Carta de Santo Atanásio ao Imperador Joviniano; nas Histórias Eclesiásticas de Teodoreto e Sócrates, podem existir variações devidas à tradução). O Credo de Atanásio, subscrito pelos três principais ramos da Igreja Cristã, é geralmente atribuído a Atanásio de Alexandria, Bispo de Alexandria (século IV), mas estudiosos do assunto conferem a ele data posterior (século V). Sua forma final teria sido alcançada apenas no século VIII. O texto grego mais antigo deste credo provém de um sermão de Cesário, no início do século VI. O credo de Atanásio, com quarenta artigos, é um tanto longo para um credo, mas é considerado por Archibald A. Hogde ‘um majestoso e único monumento da fé imutável de toda a igreja quanto aos grandes mistérios da divindade, da Trindade de pessoas em um só Deus e da dualidade de naturezas de um único Cristo.’ Apesar da data ser incerta, este credo foi elaborado para combater o arianismo e reafirmar a doutrina bíblica da Trindade [...]” (fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/santissimatrindade). [citação entre colchetes de nossa parte]

Ainda sobre a intensa discussão doutrinária que a Igreja promoveu através dos séculos, Hermann Bavinck trouxe as seguintes considerações:

"[...] A Igreja não chegou a essa rica e gloriosa confissão [da doutrina trinitariana] sem antes passar por uma dura e longa luta de tendências. Séculos da mais profunda experiência de vida espiritual dos filhos de Deus e dos mais agudos intelectos dos pais e dos mestres da Igreja foram necessários para que esse ponto da revelação da Escritura fosse entendido e reproduzido com fidelidade na confissão da igreja. Sem dúvida, a Igreja não teria obtido sucesso nesse esforço de firmar seus fundamentos se não tivesse sido conduzida pelo Espírito a toda a verdade e se Tertuliano e Irineu, Atanásio e os três santos da Capadócia, Agostinho e Hilário e muitos outros além desses, não tivessem sido homens especialmente dotados e capacitados de sabedoria para nos mostrar o caminho correto. Nada menos do que a essência peculiar do Cristianismo estava em jogo nessa luta de opiniões. Durante dois séculos a Igreja correu o risco de ser arrastada de suas fundações sobre as quais estava edificada e assim ser engolida pelo mundo [...]” (“Teologia Sistemática”, p. 169). [citação entre colchetes de nossa parte].

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Para complementar o estudo acessem:
http://www.documentacatholicaomnia.eu/03d/sine-data,_AA_VV,_A_Santissima_Trindade_Nos_Escritos_Dos_Santos_Padres,_PT.pdf

domingo, 14 de novembro de 2010

ANALOGIAS ARTÍSTICAS PARA A TRINDADE (CONCLUSÕES)

Vejamos ainda, antes de concluirmos esta parte, mais algumas analogias artísticas. Temos, a seguir, as figuras 46 a 52:










50 (fonte: http://fatimacuruca.blogspot.com/2010_05_01_archive.html) - Vejam também: http://www.artesacris.com/portal/index.php?id=1550).






Recordando todos os exemplos que vimos, é preciso destacar a figura 38 (da postagem anterior), bastante interessante se formos encará-la como uma representação do que veremos ao chegar no Paraíso, ou seja, seremos recebidos amavelmente pelo Senhor Jesus e o Pai e o Espírito Santo estarão presentes, todos em comunhão de essência uns com os outros, mas, segundo muitos estudiosos, Eles não serão vistos, apenas Cristo, pois Cristo é Deus, é a encarnação e a imagem do Deus invisível.

Destacamos também as figuras 31 (da postagem anterior) e 51 (logo acima), realmente muito belas e que não usaram diretamente todas as imagens dos personagens e dos eventos bíblicos como vimos nas demais figuras. Essas duas figuras foram mais discretas em relação a esta questão.

Ademais, é digno de nota e destaque a grande criatividade e a habilidade de todos os artistas que estiveram empenhados na produção de todas estas obras. Deus nos deu inteligência, habilidades e talentos para serem usados. Mas, infelizmente, muitas destas representações precisam e devem ser evitadas por nós cristãos protestantes devido ao engano doutrinário, a ilusão religiosa e a heresia idólatra a que muitas podem nos levar.

Relembremos o texto do livro de Deuteronômio (cf. observamos anteriormente):

“Guardai, pois, cuidadosamente, as vossas almas, pois aparência nenhuma vistes no dia em que o SENHOR vosso Deus vos falou, em Horebe, no meio do fogo; para que não vos corrompais, e vos façais alguma imagem esculpida na forma de ídolo, semelhança de homem ou de mulher; semelhança de algum animal que há na terra; semelhança de algum volátil que voa pelos céus; semelhança de algum animal que rasteja sobre a terra; semelhança de algum peixe que há nas águas debaixo da terra.” (Dt 4:15-18).

Não podemos deixar de citar outro texto importantíssimo acerca deste assunto, que confirma tudo o que observamos em postagem anterior:

“O Deus que fez o mundo e tudo o que nele existe, sendo ele Senhor do céu e da terra, não habita em santuários feitos por mãos humanas. Sendo, pois, geração de Deus, não devemos pensar que a divindade é semelhante ao ouro, à prata, ou à pedra, trabalhados pela arte e imaginação do homem.” (At 17:24,29; comparem com Is 40:18-25).

A essência ou a aparência do Criador e Senhor do universo não pode ser confundida com qualquer coisa que Ele mesmo criou. Ela não pode ser refletida por meras expressões artísticas humanas, por melhor que seja a intenção. Deus não está limitado há um local ou um objeto. Portanto, é contrário à vontade dEle que oficializemos algum tipo de figuração de Seu Ser, seja qual for. Isso seria pecado.

Como já concluímos, é impossível expressar a Trindade graficamente com um nível de acerto de 100%. Mas, alguns diagramas (como as analogias gráficas), podem ser didaticamente úteis para estudarmos a Trindade em um nível elementar de compreensão.

Vejam algumas reclarações interessantes que nos recordam as recomendações para a cuidadosa utilização de imagens dentro do catolicismo:

"[...] O CONTROLE DA IGREJA CATÓLICA SOBRE A PRODUÇÃO DE IMAGENS. Todo o poder que as imagens possuem, remetem inevitavelmente, segundo Jean-Claude Bernadet, ao poder da Igreja, que, ciosa de não perdê-lo, tende a manter um monopólio sobre a produção de imagens. As autoridades eclesiásticas têm exercido controle sobre os tipos de imagens utilizadas no culto cristão. Estas não podem ser inspiradas unicamente pelo esteticismo ou pela devoção popular exuberante, fantasista. Foi com esse pensamento que o Papa Urbano VIII, em 1628, condenou a representação da Santíssima Trindade sob forma de um tronco humano com três cabeças, e que, em 1745, Bento XIV rejeitou a cena de três pessoas sentadas uma ao lado da outra, para representar a Santíssima Trindade. Isso porque nunca o Espírito Santo apareceu sob forma humana. Foi também proibido pelo Papa Pío VI que as sagradas imagens, em particular as da Virgem Maria, recebessem outras denominações diferentes daquelas que a Igreja aprova e recomenda. Essa denominações são “temerárias, ofensivas aos ouvidos piedosos e injuriosa à veneração devida especialmente à bem-aventurada Virgem.” Para a Igreja, a arte cristã deve representar as Pessoas Divinas somente sob as formas pelas quais são citadas na Sagrada Escritura. A posição da Igreja Católica favorável às imagens não autoriza a representação direta de Deus, como uma das figuras da Santíssima Trindade. Em 1745, o Papa Bento XIV já afirmava através da Sollicitudini nostrae, citada por Denziger, que as imagens da Santíssima Trindade são temerárias e contrárias ao costume da Igreja, pois não existem imagens da Santíssima Trindade comumente aprovadas e que possam ser permitidas com segurança. A impossibilidade dessa representação será mantida pela Igreja por séculos. Durante todo o primeiro milênio as representações de Deus são extremamente raras na cristandade latina. Somente a partir do século XIII elas se tornam mais freqüentes e explodem no maneirismo e no barroco. Tanto para Kant quanto para Hegel, citados por Alain Besançon, “todas as imagens que se referem à Deus são justificáveis, mas nenhuma é verdadeira; só são verdadeiras em relação ao artista, não em relação a Deus [...]” (fonte: http://www.artesacra.art.br/historia_da_iconografia.php).

Vejam a que ponto chegou essa discussão do uso de imagens dentro dos templos, inclusive no cristianismo protestante, no seguinte site: http://caiafarsa.wordpress.com/imagens-em-templos-prostestantes.

Neste endereço acima, encontramos críticas ao protestantismo em resposta a condenação bíblica contra a idolatria que tanto nós defendemos. Em alguns casos apresentados, inclusive com fotos, é realmente verdade e é preocupante, pois a Igreja evangélica (algumas denominações) está perdendo a noção da sã doutrina biblica, mas em alguns outros casos relatados, é puro mal entendido e falta de conhecimento do que é permitido e não no assunto das artes da pintura e escultura dentro das igrejas, algo que foi praticamente banido das igrejas evangélicas, de forma radical muitas vezes, para impedir qualquer aparência do mal, qualquer menção ou traço de uma suposta e inconsciente idolatria. 

É de suma importância atentarmos para três verdades, para complementarmos tudo o que já afirmamos até agora sobre as pinturas e esculturas, algo que já afirmamos em postagens anteriores sobre a idolatria, inclusive para aqueles que são avarentos, pois avareza também é idolatria (Ef 5:5; Cl 3:5):

1ª) DEUS NÃO É CONTRA A ARTE E A CONSTRUÇÃO TRABALHADAS EM MADEIRA E PEDRAS PRECIOSAS, mas não devemos utilizar a criatividade dada por Ele, para edificarmos algo que ocupe o Seu lugar de glória e honra em nosso coração (Êx 31:3-6; 1Rs 4:29-34; 7:1-51; 8:1-66; 9:1-9; Tg 1:17);

2ª) DEUS NÃO É CONTRA AS RIQUEZAS, mas devemos honrar a Deus com os nossos bens materiais e não honrar os nossos bens primeiramente e nos esquecer de Deus (1Rs 3:11-13; 10:23-25; Pv 3:9-10; Ec 5:19); e

3ª) DEUS NÃO É CONTRA PRESTARMOS HONRAS E HOMENAGENS àquelas pessoas que as merecem, só não podemos exaltá-las e cultuá-las como deuses ou superestimá-las ao ponto de desviar para elas a glória que deve ser para Deus (Rm 13:7; Fip 2:29; 1Pe 2:17). Nossas homenagens não podem ser usadas de tal maneira que sejam um instrumento para invocar pessoas já falecidas, que foram importantes e que devem ser, sim, homenageadas e lembradas, mas não invocadas, pois invocar e consultar os mortos é abominação diante de Deus, mesmo porque este contato com os mortos é impossível (vejam todas estas referências: Lv 19:31; 20:6; Dt 18:9-14; Is 8:19; 26:13-14; Ec 3:19-22; Lc 16:19-31; Jo 5:26-29; 1Co 15:12-44; Hb 9:27; Ap 20:11-13).

Mas, por que todas as analogias, sejam de quaiquer tipos, são insuficientes? Ora, já vimos que o Espírito Santo não é uma pomba, Ele se apresentou em forma corpórea como uma pomba apenas no batismo de Cristo e não existe nenhuma outra menção bíblica de que Ele repetiu ou repetirá esse comportamento. O Pai é espírito, Ele não é um velhinho de barbas e cabelos brancos que vive sentado em um trono em uma nuvem qualquer. Cristo, sim, além se Sua natureza divina, possui a natureza humana, Ele pode ser visto em forma humana e sempre será, mas não podemos afirmar como é essa aparência com exatidão plena.

Aliás, Cristo é a imagem do Pai, que é espírito, Ele é a expressão exata do Pai. Quem vê a Cristo, vê o Pai, que está em comunhão de essência com o Filho. Tanto o Pai, como o Filho e o Espírito Santo são onipresentes e indivisíveis, cada pessoa da Trindade sempre está habitando junto com as demais em qualquer lugar do universo. Quando alguém recebe a Cristo, também recebe o Espírito Santo e obviamente o Pai está presente também, pois Deus é sempre um. Vejam as seguintes referências para terem essa mesma visão: Jo 10:30; 14:9-11, 20-23; Rm 8:9-11; 1Jo 2:23; 3:21-24.

Prezados irmãos, amigos e leitores, Deus é único. Nós nunca, jamais, quando pensarmos em Deus e até mesmo quando finalmente pudermos comtemplá-Lo face a face, veremos três seres separados, muito menos um idoso de cabelos brancos, uma pomba e um rapaz com uma cruz ou uma coroa de espinhos ou até mesmo uma criança. Isso é um pensamento ilusório, herético e ridículo.

Deus nunca se dividiu ou se separou em duas ou três pessoas literalmente falando. Quando Cristo esteve na terra e falava do Pai que estava no Céu e do Espírito que "viria" ou "seria derramado", ou, como já afirmamos, que Cristo está à direita de Deus Pai, tudo isso é um arcabouço doutrinário correto, mas está repleto de simbologia, são apenas maneiras didáticas para que nossa limitada humanidade consiga compreender um pouco das verdades divinas.

A diferença existente na essência divina indivisível está exatamente na funcionalidade trinitariana, devido a divisão de tarefas na economia do ser de Deus, ou seja, a divisão de funções que cada uma das três co-existências de Deus possui (veremos mais detalhes posteriormente). Mesmo que as pessoas da Trindade sempre estejam em união de essência, habitando umas com as outras misteriosamente, cada uma possui algumas atribuições (e não atributos) diferentes.

Todas estas pinturas e esculturas que vimos anteriormente devem ser consideradas por nós como meras simbologias da nossa fé em Deus, mas nunca uma representação 100% fiel de quem Ele é e muito menos elas podem ser consideradas como alvo de nossa adoração. Devemos adorar e servir ao único e verdadeiro Deus, que é invisível, e não uma imagem ou pintura.

Tudo bem, muitas destas ilustrações que estudamos, em algum momento, podem vir a servir de útil exposição bíblico-didática do que o Deus triúno operou na história, entre outras coisas, inclusive sempre colocando Cristo ao lado direito do Pai (outro simbolismo) e neste ponto estas pinturas não estão equivocadas, não é isso que estamos afirmando (desde que não insinuem nenhuma heresia, evidentemente, como é o caso daquelas pinturas que incluem Maria como participante da Divindade, como intercessora).

Contudo, como já afirmamos, é preciso muito cuidado para que não caiamos no gigantesco equívoco de acreditar que essas ilustrações representam a imagem do Deus que adoramos e servimos. Isso é um claro engano e uma ilusão herética.

Encerrando, portanto, que o nosso único e verdadeiro Deus seja glorificado para todo o sempre. Amém.


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Vejam muitas outras figuras complementares àquelas vistas neste estudo:

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Para se ter noção como o termo "Santíssima Trindade" se tornou mal utilizado na sociedade, algumas vezes para diversos setores da atividade humana, outros até mesmo com conotação blasfema ou satírica e muitas vezes sem conhecimento alguma da doutrina trinitaria, vejam:


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Comparem ainda com: