sábado, 2 de outubro de 2010

A TRINDADE NO ANTIGO TESTAMENTO (PARTE 04)

O "ANJO DO SENHOR" ATUANDO NO PERÍODO DOS JUÍZES

Prosseguindo ainda mais no estudo da "Cristologia Vetero-testamentária, observamos que logo no início do livro de "Juízes", já encontramos o Anjo do SENHOR em ação com o povo de Israel novamente. Vejamos a narrativa bíblica:

"Subiu o Anjo do SENHOR de Gilgal a Boquim e disse: Do Egito voz fiz subir e voz trouxe à terra que, sob juramento, havia prometido a vossos pais. Eu disse: nunca invalidarei a minha aliança convosco. Vós, porém, não fareis aliança com os moradores desta terra; antes, derribarei os seus altares; contudo, não obedecetes à minha voz. Que é isso que fizestes? Pelo que também eu disse: não os expulsarei de diante de vós; antes, vos serão por adversários, e os seus deuses vos serão laços. Sucedeu que, falando o Anjo do SENHOR estas palavras a todos os filhos de Israel, levantou o povo a sua voz e chorou. Daí, chamarem a esse lugar Boquim; e sacrificaram ali ao SENHOR." (Jz 2:1-5).


O Anjo do SENHOR apareceu ao povo e disse que Ele conduzira o povo do Egito até aquela terra, sobre a qual Ele mesmo, o Anjo havia prometido sob juramento aos antepassdos do povo e havia dito que jamais invalidaria esta aliança. E mais: O Anjo ainda lembrou que havia ordenado ao povo que não fizesse aliança com os moradores daquela terra, mas, destruissem os altares idólatras deles, contudo, o povo de Israel não obedeceu a Sua voz. Percebam que tudo o que o Anjo disse que pronunciou ao povo, na verdade foi o SENHOR que disse (vejam, por exemplo: Ex 34:12-13; Nm 20:16; 23:20-23; Dt 7:2-5; comparem com At 7:30-38). E mais: após o pronunciamento do Anjo do SENHOR, houve um grande quebrantamento entre o povo, que ofereceu sacríficos ao SENHOR (v. 5).

Vejam no conhecido "Cântico de Débora", juíza de Israel, como o Anjo do SENHOR e o SENHOR continuavam presentes na vida do povo:

"Amaldiçoai a Meroz, diz o Anjo do SENHOR, amaldiçoai duramente os seus moradores, porque não vieram em socorro do SENHOR, em socorro do SENHOR e seus heróis." (Jz 5:23).

Mais uma grande narrativa, agora sobre a vida de Gideão, outro juíz de Israel, nos apresenta a atuação do SENHOR e do Seu Anjo:


"Então, veio o Anjo do SENHOR, e assentou-se debaixo do carvalho que está em Ofra, que pertencia a Joás, abiezrita; e Gideão, seu filho, estava malhando o trigo no lugar, para o pôr a salvos dos midianitas. Então, o Anjo do SENHOR lhe apareceu e lhe disse: O SENHOR é contigo, homem valente. Respondeu-lhe Gideão: Ai, senhor meu! Se o SENHOR é conosco, por que nos sobreveio tudo isso? E que é feito de todas as suas maravilhas que nossos pais nos contaram, dizendo: Não nos fez o SENHOR subir do Egito? Porém, agora o SENHOR nos desamparou e nos entregou nas mãos dos midianitas. Então, se virou o SENHOR para ele e disse: Vai nessa tua força e livra Israel da mão dos midianitas; porventura, não te enviei eu? E ele lhe disse: Ai, Senhor meu! Com que livrarei Israel? Eis que a minha família é a mais pobre em Manassés, e eu, o menor na casa de meu pai. Tornou-lhe o SENHOR: Já que eu esotu contigo, ferirás os midianitas como se fossem um só homem. Ele respondeu: Se, agora, achei mercê diante dos teus olhos, dá-me um sinal de que és tu, SENHOR que me falas. Rogo-te que daqui não te apartes até que eu volte, e traga a minha oferta, e a deponha perante ti. Respondeu ele: Esperarei até que voltes. Entrou Gideão e preparou um cabrito e bolos asmos de um efa de farinha; a carne pôs num cesto, e o caldo, numa panela; e trouxe-lho até debaixo do carvalho e lho apresentou. Porém o Anjo de Deus lhe disse: Toma a carne e os bolos asmos, põe-nos sobre esta penha e derrama-lhes por cima o caldo. E assim o fez. Estendeu o Anjo do SENHOR a ponta do cajado que trazia na mão e tocou a carne e os bolos asmos; então, subiu fogo da penha e consumiu a carne e os bolos; e o Anjo do SENHOR desapareceu de sua presença. Viu Gideão que era o Anjo do SENHOR e disse: Ai de mim, SENHOR Deus! Pois vi o Anjo do SENHOR face a face. Porém o SENHOR lhe disse: Paz seja contigo! Não temas! Não morrerás! Então, Gideão edificou ali um altar ao SENHOR e lhe chamou de O SENHOR é Paz. Ainda até ao dia de hoje está o altar em Ofra, que pertence aos abiezritas."  (Jz 6:11-24).

Podemos destacar muitas lições trinitárias aqui. O Anjo do SENHOR apareceu a Gideão e, como representante do próprio SENHOR, disse: "O SENHOR é contigo homem valente" (Jz 6:12). Já imaginou o próprio Deus falar isso para você? Não existe maior incentivo. Mas, Gideão, certamente sabendo que o Anjo era o próprio SENHOR ou o Seu representante direto, questionou diretamente ao SENHOR e não ao Anjo a situação pela qual Israel atravessava, pois já que o Anjo do SENHOR afirmou "O SENHOR é contigo", como que depois de tamanhas maravilhas realizadas no livramento de Israel do Egito e a peregrinação até a terra prometida, o SENHOR estava permitindo tamanha opressão do povo midianita (v. 13).

Então, o próprio SENHOR, que certamente estava presente ali, mas ainda não se manifestara, "se virou para Gideão" e respondeu ao questionamento, incentivando-o e confirmando que Ele, o SENHOR estava enviando Gideão para livrar a nação de Israel dos midianitas (v. 14). E mesmo Gideão insistindo em afirmar a pobreza e a simplicidade dele e de sua família diante de tão grande missão, o SENHOR confirmou uma vez mais que Gideão feriria os midianitas como se fossem um só homem, pois Ele, o SENHOR estava com Gideão (vv. 15-16).

Mas, Gideão ainda quis que o SENHOR desse um sinal de que era Ele mesmo que estava falando, sinal de era alvo da mercê divina e suplicou para que Deus não se ausentasse daquele lugar até que ele voltasse com sua oferta, pedido que o SENHOR atendeu (vv. 17-18), sendo que Gideão preparou a oferta e a trouxe e a apreentou ao SENHOR, colocando-a debaixo do carvalho (v. 19), justamento o carvalho onde no início o Anjo do SENHOR se assentara debaixo (v. 11).

Nesse momento, o texto chama o "Anjo do SENHOR" de "o Anjo de Deus" (como em outros textos) e afirma que Ele ordenou que Gideão tomasse a oferta, carne e bolos asmos, pusesse sobre a penha e derramasse o caldo por cima, o que Gideão obedeceu (v. 20). Então o "Anjo do SENHOR" (o texto volta a chamar o Anjo desta forma) estendeu a ponta do cajado que estava em Sua mão e tocou a oferta, o que fez com que fogo subisse da penha e consumisse a oferta. Logo em seguida, o Anjo do SENHOR desapareceu da presença de Gideão (v. 21). E foi apenas neste momento que Gideão percebeu que era o Anjo do SENHOR e exclamou: "Ai de mim, SENHOR Deus, pois vi o Anjo do SENHOR face a face" (v. 22).

Ora, aqui temos que nos deter um momento e questionar: Não é sabido e ensinado que nenhum ser humano pode ver Deus face a face porque morrerá? É o que nos ensina o texto de Êxodo 33:17-25, quando Moisés, mesmo com tamanha comunhão com o SENHOR, não teve a permissão para ver a glória de Deus, mas Deus a encobriu com Sua própria mão, pois Moisés morreria se visse Sua glória.

Como então que Gideão ao ver o Anjo do SENHOR temeu por tê-lo visto face a face se não fosse reconhecido em Israel que o Anjo do SENHOR era o próprio Deus? Se Ele fosse um anjo comum, um mensageiro celestial, como tantos outros encontrados na Bíblia, porque Gideão teria tanto medo de morrer? Mas quem disse que Gideão ficou com medo de morrer? O próprio Deus disse, pois em seguida o SENHOR  acalma Gideão, dizendo (neste momento, o Anjo do SENHOR estava ausente): "Paz seja contigo! Não temas! Não morrerás!" (v. 23).

Por que Deus disse "não morrerás"? Encontramos duas posições distintas:

1) Por que, na verdade, o Anjo não era Deus e então Gideão não tinha visto Deus face a face?

2) Ou por que o Anjo era Deus, sim, mas o próprio SENHOR em Sua soberania, não permitiu a morte de Gideão, pois, na verdade, o Anjo se manifestara em uma forma humana (teofania) e então, não estava manifestando toda a glória de Deus?

Bem, preferimos ficar com a segunda posição, pois já foi demonstrado e ainda será demonstrado exaustivamente que o Anjo do SENHOR é o SENHOR. Então sendo assim, Deus estava compartilhando a Sua glória com o Anjo Dele, sim, (glória que nenhum homem pode contemplar face a face e permanecer vivo), pois o Anjo de Deus era um em essência com Ele, mesmo sendo distinto Dele. Deus não compartilharia Sua excelsa glória com ninguém que não estivesse em eterna e indivisível unidade de essência com Ele.

Em seguida, então, Gideão edificou naquele local um altar ao SENHOR com o nome de "O SENHOR é paz" (v. 24).

Prosseguindo na narrativa, na mesma noite, o SENHOR deu instruções a Gideão para derribar o altar de Baal e cortar o poste-ídolo junto ao altar e edificar a Ele, o SENHOR, o Deus de Gideão, um altar e oferecer holocausto com a mesma lenha do poste-ídolo que tivesse cortado (Jz 6:25-26). Gideão obedeceu ao SENHOR, mas fez tudo a noite e não de dia, temendo as pessoas da casa de seu pai e daquela cidade, pois o altar era do pai de Gideão (v. 27).

De madrugada os homens daquela cidade se levantaram e viram o altar de Baal derribado, bem como o poste-ídolo, que também estava cortado e o boi que fora oferecido ao SENHOR no altar derribado (v. 28) e concluíram que fora Gideão o responsável por tudo aquilo (v. 29) e, cheios de fúria, foram a Joás, pai de Gideão e contaram o ocorrido e pediram que trouxesse seu filho para fora para morrer (v. 30). Joás, porém, afirmou que não precisava aquela contenda por causa de Baal, pois, se este era uma divindade, ele mesmo contenderia contra aqueles que derribaram o seu altar (v. 31).

E, Gideão, no mesmo dia, por ter derribado o altar de Baal, e na expectativa de que este deus contendesse contra ele, passou a ser chamado "Jerubaal" (v. 32) e todos os midianitas e amalequitas e povos do Oriente se ajuntaram e se acamparam no vale de Jezreel (v. 33). Mas, vejamos a narrativa seguinte:

"Então, o Espírito do SENHOR revestiiu a Gideão, o qual tocou a rebate, e os abiezritas se ajuntaram após dele." (v. 34).

Gideão, assim como Balaão, que vimos anteriormente, também foi revestido pelo Espírito do SENHOR. Portanto, ele também teve contato com as três pessoas da Santíssima Trindade.

Ressaltamos que é evidente que quando afirmamos algo assim, só o fazemos porque o Novo Testamento já nos revelou e confirmou as três pessoas da Divindade, o Pai, o Filho e o Espírito Santo e complementou e interpretou a história do Antigo Testamento (o que estudaremos posteriormente com as evidências neo-testamentárias da doutrina trinitariana). Ademais, é evidente que apenas lendo essas narrativas vetero-testamentárias não é possível vislumbrar, por exemplo, a pessoa do Filho de Deus, a segunda da Trindade, mas apenas inferir claramente que o Anjo do SENHOR à luz do Novo Testamento só pode ser a manifestaçao pré-encarnada do Filho. Mas, veremos mais adiante que as pessoas do Deus Pai e do Deus Espírito Santo, a primeira e a terceira da Trindade, são claramente inferidades desde que também interpretadas à luz do Novo Testamento.

Encerrando esta parte, é notável verificar também a participação do Anjo do SENHOR na história de Sansão, também juíz de Israel, em uma época que Israel era dominado pelos filisteus há décadas, por terem se desviado de Deus (Jz 13:1). O Anjo do SENHOR apareceu à uma mulher que era estéril, esposa de Manoá, da linhagem da tribo de Dã, e prometeu-lhe que daria à luz um filho, mas advertiu-a a não beber vinho, nem bebida forte e nem comer nada considerado imundo pela Lei moisaica e assegurou que este filho seria nazireu, ou seja, cujos cabelos jamais seriam cortados e seria consagrado a Deus desde a concepção e, quando crescesse, iniciaria a libertação de Israel do poder os filisteus (Jz 13:2-5).

Esta mulher, sem ter compreendido que tinha falado com ela, foi ao seu marido, Manoá, e disse que "um homem de Deus com aparência tremenda e semelhante à de um anjo de Deus tinha se apresentado a ela, mas ela não perguntou a origem dele e ele não disse o seu nome" e repassou a mensagem do Anjo ao marido (v. 6). Manoá, então, orou ao SENHOR, reconhecendo que tinham recebido um mensageiro divino, suplicando que este "homem" retornasse e lhes instruisse sobre a criança que haveria de nascer (v. 8). Deus ouviz Manoá e o "Anjo de Deus" se manifestou novamente em uma oportunidade que a mulher estava sozinha (v. 9), mas ela apressadamente buscou o seu marido, o qual suplicou que o Anjo fornecesse mais instruções sobre a concretização da promessa do menino (vv. 10-12). Então, o Anjo do SENHOR confirmou Suas instruções anteriormente dadas à mulher (vv. 13-14).

O grande destaque para a ainda maior fundamentação vetero-testamentária da doutrina trinitariana vem exatamente nos próximos versículos: Manoá pediu que o Anjo do SENHOR permanecesse com eles, pois pretendiam preparar um cabrito como refeição (v. 15), mas o Anjo do SENHOR disse que mesmo que Ele permanecesse com eles, não aceitaria a refeição. E disse mais: se eles tivessem a intenção de preparar um holocausto, que este deveria ser dirigido ao SENHOR. E o texto ainda afirma que o Anjo disse essas palavras porque Manoá não havia ainda reconhecido que quem falava com ele era o Anjo do SENHOR (v. 16). Percebemos que o Anjo em uma atitude de humildade extrema, apesar de Sua Divindade, pediu para que a adoração fosse direcionada ao SENHOR e não a Ele.

Mas, em seguida, Manoá pede que o Anjo informe o Seu nome para que, quando a promessa do nascimento da criança se cumprisse, eles pudessem prestar-lhe honras (v. 17). É, então, que o Anjo demonstra Sua Divindade, pois diz a Manoá: "Por que perguntas pelo meu nome que é maravilhoso?" (v. 18). Ora, o SENHOR permitiria que um anjo comum dissesse algo assim? Evidente que não, apenas se este Anjo fosse um em essência com Ele.

Em seguida, Manoá apresenta uma oferta ao SENHOR e o Anjo do SENHOR, segundo o texto "se houve maravilhosamente" (v. 19). Quando a chama do sacrifício saiu do altar e subiu em direção ao céu, o Anjo do SENHOR subiu nela e Manoá e sua mulher caíram com o rosto em terra (v. 20) e nunca mais o Anjo do SENHOR apareceu para eles, só então que Manoá compreendeu que era o Anjo do SENHOR (v. 21) e, diante disso disse a sua mulher: "Certamente morreremos porque vimos a Deus" (v. 22). Percebam que Manoá se deixou atemorizar pelo mesmo receio que teve Gideão, pois Israel sabia que o Anjo do SENHOR era o próprio SENHOR, que ver o Anjo do SENHOR era como comtemplar a Deus face a face. Mas, a mulher de Manoá o acalmou com sua tese de que jamais o SENHOR teria aceitado a oferta deles e nem revelado os Seus planos se Sua intenção fosse tirar a vida deles (v. 23).

O texto bíblico relata em seguida que a mulher de Manoá deu à luz um filho e o chamou Sansão, que cresceu e foi abençoado pelo SENHOR (v. 24). E, para fundamentar ainda mais a doutrina trinitariana no Antigo Testamento, o texto ainda nos informa que o Espírito do SENHOR passou a atuar na vida de Sansão (v. 25; comparem ainda com Jz 14:6,19; 15:14;, por exemplo). Portanto, temos mais um personagem importante da história de Israel cuja história foi permeada pela atuação da Trindade Santíssima.

Mas, referente a atuação específica do Espírito Santo no Antigo Testamento, veremos detalhadamente nas postagens logo depois do término desta parte do nosso estudo.

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